Comissão Parlamentar de Inquérito da Cemig investiga contratos firmados pela empresa sem licitação – Foto: Uarlen Valério

CPI vai investigar empresa de call center de um ex-secretário de Zema que perdeu um certame na estatal e, depois, teria sido subcontratada

Um contrato bilionário firmado pela Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) com a IBM por inexigibilidade de licitação deve ser alvo da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Assembleia Legislativa nos próximos dias. Até agora, esse é o contrato de maior valor e sem licitação a ser analisado pela CPI e, segundo os deputados, implica na subcontratação de uma empresa ligada a um ex-secretário do governo Zema.

No valor de R$ 1,1 bilhão, o contrato de “parceria estratégica” com a IBM foi publicado no Diário Oficial de Minas Gerais no dia 12 de fevereiro, na véspera do feriado de Carnaval. e tem validade de dez anos. O objetivo, segundo a publicação, são “serviços especializados de (i) consultoria em transformação digital e (ii) desenvolvimento, implementação e operação do modelo omnichannel de atendimento aos clientes (iii) otimização do custo total de operação”.

Segundo o vice-presidente da CPI, deputado Professor Cleiton (PSB), o valor e o prazo do contrato chamam bastante atenção. “O contrato da IBM é o maior contrato verificado pela CPI. Nos chama a atenção o prazo do contrato, de dez anos, que não é comum na administração pública, seu valor, superior a R$ 1 bi, o fato de não ter sido licitado, uma vez que temos no mercado tantas empresas de tecnologia”.

Mas, conforme o parlamentar, chama ainda mais atenção o fato de que, antes do contrato com a IBM, a Cemig realizou uma licitação para contratação de atendimento por call center, cujo vencedor não assumiu os serviços, tendo sido prorrogado o contrato com a empresa anterior, a AeC, que participou da concorrência, mas perdeu por uma diferença de R$ 500. A AeC foi fundada e era de propriedade do ex-secretário de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais, Cássio Rocha de Azevedo, que morreu em junho deste ano. Essa mesma empresa teria sido subcontratada pela IBM no contrato firmado neste ano.

“Antes da realização desse contrato, houve um certame público para os serviços de atendimento telefônico ao público, o qual a empresa ganhadora ainda não se mobilizou. E o que sabemos é que a empresa do ex secretário de Estado Cássio Azevedo está prestando o serviço de atendimento telefônico”, explicou o deputado. A empresa vencedora do certame público citado pelo deputado é a Audac Serviços Especializados de Atendimento ao Cliente, em um processo licitatório homologado em 5 de março de 2020.

Outro deputado que também integra a CPI e pediu para não ser identificado reforça as suspeitas do Professor Cleiton. “São plausíveis algumas suspeitas de que o ex-secretário do governador era dono de uma empresa que prestava serviços para a Cemig e que participou de uma licitação depois que o contrato findou, mas perdeu. A Cemig não homologou (o resultado) e contratou a IBM, que subcontratou essa mesma empresa (do ex-secretário) por valores acima do que o que era praticado na licitação”, disse. Ele frisou ainda que isso são suspeitas e que a CPI ainda trabalha no levantamento das provas.

A partir dos documentos analisados, a deputada Beatriz Cerqueira (PT) também chegou a conclusões semelhantes. “Eu já tinha recebido uma denúncia sobre isso, que não é nem dos documentos da CPI, e é isso mesmo: teve um processo licitatório do centro de call center da Cemig, e depois a migração para a contratação sem licitação da IBM e com subcontratação da empresa que, até março de 2020 prestava serviço diretamente”, disse.

A próxima sessão da CPI está marcada para segunda-feira, quando devem ser ouvidos Wantuil Dionísio Teixeira, superintendente do Centro de Serviços Compartilhados da Cemig, e Silvia Cristiane Martins Batista, ex-superintendente de Relacionamento Comercial da estatal. Segundo o deputado professor Cleiton, eles podem trazer informações novas sobre esse contrato com a IBM. “Acreditamos que esses funcionários tenham muito o que contribuir em relação ao assunto”, disse Professor Cleiton.

Empresa que venceu licitação e não foi habilitada cobra reembolso da Cemig

A Audac, empresa que venceu a licitação para prestação de serviços de call center em uma licitação realizada no ano passado, mas não teve a ordem de serviço assinada, informou por meio de nota que está cobrando da Cemig os valores investidos por ela para o contrato. “Existe um questionamento pré-judicial por parte da Audac e de seus advogados a respeito dos valores a serem reembolsados/pagos e que estão pendentes até o momento”.

Informou ainda que a rescisão foi unilateral e que não foi informada da justificativa da decisão. “Não, não recebemos. A denúncia do contrato firmado foi informada por ser de interesse da Cemig (juridicamente denúncia de rescisão contratual vazia – sem justificativa de motivação)”. A Audac também informou que a carta de cancelamento contratual foi recebida pela empresa no dia 16 de fevereiro deste ano, durante o feriado de Carnaval e quatro dias após a assinatura do contrato com a IBM.

E acrescentou que, ao longo do período de vigência do contrato, questionou a empresa por diversas vezes questionou a Cemig sobre a assinatura da ordem de serviços. “Questionamos por diversas vezes, isso porque existia prazo contratual e com previsão de multa se houvesse atraso por parte da contratada, motivo pelo qual, por diversas vezes houve questionamento pela AUDAC sobre a emissão formal da ordem de serviço, mas o retorno foi protelatório até o momento em que recebemos a rescisão unilateral.

Resposta AeC

Já a AeC, que perdeu a licitação, teve o contrato prorrogado e, posteriormente teria sido subcontratada pela IBM, informou apenas que “atua há quase 30 anos no mercado, tendo prestado serviços para centenas de empresas” e que “ todos os contratos e serviços prestados ao longo de mais de uma década para a Cemig foram pautados pela legalidade, idoneidade e pela absoluta transparência”.

A empresa reafirmou ainda “seu compromisso de colaborar com toda e qualquer apuração que demande sua participação e reitera que todas as suas relações institucionais e comerciais sempre se nortearam pela ética e pelo conjunto das melhores práticas de integridade e compliance”.

Cemig alega unificação de serviços para justificar valor de contrato

Procurada, a Cemig explicou que a IBM é uma parceira da estatal no Projeto Cliente +, responsável pelo atendimento aos mais de 8 milhões de clientes. Ainda segundo a empresa, o escopo desse contrato seria a “integração de todos os canais de atendimento em uma única plataforma (omnichannel)” e o custo “é inferior ao custo somado de todos os demais fornecedores que prestavam os atendimentos descentralizados”.

A companhia explicou ainda que “ao contrário das contratações anteriores, que remuneravam fornecedores por tempo de atendimento, o Cliente + remunera por resolução no atendimento, favorecendo os clientes e reduzindo custos para a Cemig”. No entanto, o programa ainda não foi completamente implantado.

Em relação à Audac, que venceu a licitação realizada em 2020, mas não teve a ordem de serviço assinada, a Cemig explicou que “não foi dada autorização para início do serviço já que no período previsto para isso, em março de 2020, houve o início da pandemia de Covid-19 e do isolamento social” e “a transição de fornecedor e treinamento presencial subsequente gerariam riscos a funcionários naquele momento”.

Posteriormente, a empresa “desistiu da contratação, já que decidiu implantar o Projeto Cliente +, unificando os atendimentos por meio da parceria com a IBM e fortalecendo seu ambiente digital, necessidade reforçada pela própria pandemia”.

Procurado, o governo de Minas e a IBM não responderam.

Jornal O Tempo

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