Memes responsabilizando ministro por suposto aumento de taxas ignoram que impostos diminuíram no atual governo. Onda se fortalece justamente quando o clã Bolsonaro é alvo da Justiça

Ministro da Fazenda, Fernando Haddad e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (Foto: Fabio Pozzebom – Agência Brasil)

Quando se vê acuada, a extrema direita usa, como uma de suas armas favoritas, a disseminação de mentiras e desinformação em escala industrial, via redes sociais. O alvo da vez é o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que seria, no universo paralelo bolsonarista, o responsável por um suposto aumento na carga tributária. Mas, o que os dados indicam é que os impostos não apenas não aumentaram, como ainda diminuíram no governo Lula.

O uso de recursos discursivos da sátira e da paródia é uma forma legítima de criticar a política e a sociedade e faz parte da história da comunicação.

No entanto, com a massificação das redes sociais e sua instrumentalização especialmente pela extrema direita (com a anuência ou o apoio dos donos das big techs), conteúdos com esse teor — traduzidos em memes e vídeos, por exemplo — passaram a ser utilizados como forma de distorcer fatos e espalhar mentiras em larga escala, resultando, muitas vezes, na destruição de reputações, no desrespeito aos direitos humanos e no fortalecimento de projetos pessoais e de poder.

Com é sabido, os bolsonaristas têm se utilizado desse expediente para estimular o ódio e a violência e manter os seus seguidores mais fanáticos e obtusos permanentemente mobilizados. O objetivo final é  atacar e enfraquecer adversários e as instituições — para assim esfarelar a democracia —, desgastar o governo Lula para facilitar o retorno da extrema direita ao poder e, claro, criar cortinas de fumaça quando o calo deles aperta.

Não é de hoje que Jair Bolsonaro, sua família e seu entorno vêm sendo investigados por desvios e crimes de toda ordem. Mais recentemente, dois assuntos deixaram o grupo especialmente incomodado.

Um deles foi o indiciamento, pela Polícia Federal, do ex-presidente e de outros elementos do seu séquito no inquérito das joias sauditas — que expôs um esquema criado para a apropriação ilegal de bens do Estado brasileiro em favor de Bolsonaro. O outro caso é a investigação da Abin paralela, que desnudou o uso clandestino e ilegal da Agência Brasileira de Inteligência, sob Bolsonaro, para espionar e perseguir desafetos e beneficiar o clã.

Em meio a tudo isso, nada melhor do que lançar petardos para o outro lado, a fim de desviar a atenção do povo para a sujeira que veio à tona, com o benefício de, ainda, criar desgastes ao governo. E no Brasil, o tema do pagamento de impostos é um dos que mais ressoam junto à população de todos os estratos sociais.

Campanha distorsiva

Ao que parece, da junção desses interesses emergiu a atual “campanha” contra o ministro que, embora possa ser bem-humorada e criativa na construção de algumas peças — elementos fundamentais para garantir sua disseminação orgânica — nada tem de inocente e investe na distorção dos fatos.

Um efeito prático da campanha foi noticiado pelo colunista Lauro Jardim, de O Globo, nesta quarta-feira (17). Segundo ele, de acordo com levantamento feito pela consultoria Arquimedes, termos como “taxa”, “imposto” e outros relacionados a esses assuntos tiveram, desde o início do ano, com maior peso a partir de maio, nove milhões de menções no Facebook, Instagram e X.

A reação do governo e do PT ainda é tímida. Mas, o tema está no radar de ambos e memes de “contra-ataque” também já viralizaram, como o do “Exterminador de Tributos”. E nesta terça-feira (16), por exemplo, o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin, se contrapôs à campanha e salientou que os impostos não aumentaram no atual governo.

“Em 2023, a carga tributária bruta foi 32,4% do PIB [Produto Interno Bruto]. Ela era 33,7% até 2022. A carga tributária não só não aumentou no governo do presidente Lula como caiu. Caiu para 32,4%. Então, não teve aumento de carga tributária, até reduziu em 0,6%”, afirmou. Aliás, segundo dados do governo, o percentual atingido no ano passado é o menor desde 2020 — quando, diga-se, Bolsonaro era presidente.

Alckmin também reconheceu que a carga tributária nesse patamar é alta para um país em desenvolvimento, mas considerou que o Brasil avançou com a reforma tributária. “Tem um fato importantíssimo que é a reforma tributária. Simplifica, substitui cinco impostos de consumo, IPI, PIS, Cofins, ISS e ICMS, por um IVA dual. Desonera completamente exportação, desonera completamente investimento. Agora, alguns querem enganar. Não tem aumento nenhum, estamos é simplificando”.

Reportagem da Folha de S. Paulo desta terça-feira (16) também mostrou o impacto da reforma tributária na redução das taxas, sobretudo para quem ganha menos. “A versão atual da reforma reduz a carga sobre o consumo de 50% da população — justamente as pessoas de menor renda. Os 20% de maior renda passam a contribuir com uma parcela maior dessa arrecadação”, diz. Essa redução pela metade já havia sido apontada em cálculo feito pelo Banco Mundial.

Além disso, aponta, “para o restante, a situação não muda, considerando a versão da reforma modelada pelo Congresso. A proposta original do governo desonerava essa parcela da classe média, mas esse ganho foi perdido com as exceções criadas pelo Legislativo”.

A versão aprovada, aliás, zerou o imposto sobre a carne, mas o efeito foi a redução do cashback. Ainda assim, a devolução do imposto, que hoje não existe, vai beneficiar a parcela mais vulnerável. Vale destacar ainda que, de acordo com cálculos do governo, a alíquota de referência atual é de 34,4% e com a reforma, deverá ficar em 27%.

Ao jornal, o secretário de Comunicação do partido, Jilmar Tatto, apostou que passada a onda atual das redes, o que ficará de Haddad é o aumento da faixa isenta do Imposto de Renda e o próprio cashback.

Mau humor dos endinheirados

Mas, pode ser também que a atual indisposição com Haddad reflita o mau humor de alguns segmentos que antes, mal pagavam impostos (e continuam pagando muito pouco em relação ao que ganham).

Afinal, o governo Lula criou a lei que muda o Imposto de Renda sobre fundos de investimentos e sobre a renda obtida no exterior por meio de offshores, de maneira que os donos dessas contas paguem 15% de alíquota.

Outro ponto importante é que reforma tributária possibilitará a cobrança de Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) de aeronaves e embarcações de luxo, como iates e jatinhos, o que pode render mais de R$ 10 bilhões por ano aos cofres público.

Cabe destacar, ainda, que o governo — Lula e Haddad à frente — têm encampado a luta pela taxação dos super-ricos em 2%, o que pode levar à arrecadação de até US$ 250 bilhões no mundo por ano.

Seja como for, nesta terça-feira, em reunião com o presidente Lula e empresários no Palácio do Planalto, Haddad falou sobre a onda de fake news. “Eu tenho certeza em dizer que nós temos que apressar a chegada das boas novas à população de uma maneira geral. A boa notícia está demorando a chegar, e, às vezes, as fake news chegam muito rapidamente”, pontuou. E completou: “Nós vamos correr para superar as fake news e mostrar para as pessoas o que já está acontecendo”.

por Priscila Lobregatte – Vermelho

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