Já passa de 21h quando, cercado por um batalhão de fotógrafos e cinegrafistas, além dos admiradores que disputam fisicamente o privilégio de tirar uma foto ou tocá-lo, entra no palco da concha acústica da Uerj o ex-presidente Lula. Faz calor no Rio, na noite desta sexta-feira, 8 de dezembro. Fisionomia cansada pela maratona a que se submete desde que iniciou seu périplo pelo estado do Rio, Lula mantém aquele brilho no olhar que o caracteriza.
Depois de alguns minutos de empurra-empurra, esse senhor de 72 está diante de uma multidão entusiasmada que o ovaciona. Logo, sem disfarçar a rouquidão, começa seu discurso marcado por forte conteúdo político, mas, como sempre, repleto de passagens que emocionam seus ouvintes e enchem o ar de esperança.
É o Lula velho de guerra fazendo o que mais gosta que é conversar com as pessoas. Durante 40 minutos a plateia prende a respiração. Impressiona o silêncio respeitoso generalizado na hora da fala de Lula.
E mesmo para veteranos como eu, que o acompanha desde o final dos anos 70, é impossível racionalizar suas frases e argumentos durante todo o tempo. É preciso ser uma rocha de gelo para não marejar os olhos quando ele, de microfone em punho, dispara sua verve contundente e afetuosa ao mesmo tempo.
Enquanto Lula desancava o governo golpista, enumerava as realizações de seus mandatos, esboçava algumas propostas para seu futuro governo e desafiava a Lava Jato a provar o desvio de um centavo sequer de sua parte, eu ficava a imaginar o quanto sou grato ao destino pelo prêmio de ser contemporâneo do maior líder popular da história do país.
Depois, projetando o futuro, vislumbrei a infinidade de teses acadêmicas de sociólogos, historiadores, cientistas políticos e da intelectualidade em geral que terão como objeto de estudo e pesquisa o fenômeno Luiz Inácio Lula da Silva.
Fenômeno dos mais marcantes e complexos, que só não é assim entendido pelos que têm a visão turvada pelo preconceito, pelo ódio aos pobres ou por um ideário político-ideológico pretensamente esquerdista na superfície, mas elitista na essência.
Qualquer outro político (do Brasil ou de todos os outros países, no presente e no passado) que por ventura fosse vítima da caçada implacável que Lula sofre há tantos anos já teria virado pó. Antes, a bombardeá-lo diuturnamente, tínhamos o monopólio da mídia e os donos do dinheiro. Lula sobreviveu, derrotou-os e foi eleito e reeleito presidente da República.Deixou o governo com mais de 80% de aprovação.
De uns anos para cá, a burguesia mais vagabunda do planeta e a mídia venal ganharam um reforço de peso na cruzada para destruir Lula : as próprias instituições do Estado, como MP, Judiciário, Polícia Federal e TCU. Fora as ramificações internacionais que esse consórcio antidemocrático possui.
Tudo em vão. Lula segue firme, lidera todas as pesquisas e é idolatrado pelo povo por onde passa. Os tiros de canhão contra esse heroico sobrevivente da seca e da fome vão um a um saindo pela culatra. A perseguição teve efeito bumerangue : o homem virou mito ainda em vida.
E, agora, quem será capaz de arrancar Lula de seu lugar cativo no coração do povo brasileiro? Terão coragem mesmo de acender um palito de fósforo num paiol de combustível e impedir sua candidatura? Apostarão no caos absoluto que sua prisão provocaria? Aposto em mais uma vitória do imbatível Lula. Quem viver verá.
* Bepe Damasco é editor do Blog do Bepe