Oficialmente, o governo resumiu o pacote a “medidas de contenção de despesas” para “tornar o gasto público mais eficiente”. Na prática, porém, os retrocessos estão encaminhados.
Num aguardado pronunciamento em cadeia de rádio e TV, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou, na noite desta quarta-feira (27), cortes e ajustes que devem levar a uma economia de R$ 70 bilhões no orçamento da União em 2025 e 2026. Genérica e recheada de eufemismos, a fala de Haddad não detalhou as propostas e deu ênfase às diretrizes do pacote.
“Precisamos cuidar ainda mais da nossa casa. É por isso que estamos adotando as medidas necessárias para proteger a nossa economia”, declarou Haddad, que não citou o arcabouço fiscal – pretexto maior para o anúncio.
Oficialmente, o governo resumiu o pacote a “medidas de contenção de despesas” para “tornar o gasto público mais eficiente”. O lema do pronunciamento foi nessa direção: “Brasil Mais Forte – Governo Eficiente e País Justo”.
Na prática, porém, os retrocessos estão encaminhados. Haverá, por exemplo, um cerco à política de valorização do salário mínimo.
A regra atual prevê que o reajuste anual do mínimo levará em conta a inflação do período e o crescimento oficial do Produto Interno Bruto (PIB) nos dois anos anteriores. Mas, segundo Haddad, qualquer aumento nos próximos anos deverá obedecer à “nova regra fiscal”.
A crer no noticiário da grande mídia, a equipe econômica quer impor um teto de 2,5% ao reajuste. Uma entrevista coletiva prevista para a manhã desta quinta-feira (28) detalhará as metas que Haddad preferiu evitar no pronunciamento.
Restrições
O abono salarial (PIS/Pasep) e o BPC (Benefício de Prestação Continuada) tampouco serão poupados. Sem citar números, o ministro admitiu que o governo restringirá o acesso a esses direitos.
No caso do abono – que hoje beneficia quem ganha até dois salários mínimos (R$ 2.824) –, a previsão é limitar apenas a quem recebe um mínimo (R$ 1.412). Além disso, a carência passará de 30 para 90 dias. A medida, portanto, prejudica os trabalhadores mais pobres.
Já para o BPC, hoje estipulado em um salário mínimo, o governo pretende reforçar o chamado “pente-fino” – uma fiscalização mais rigorosa com o objetivo de identificar e coibir irregularidades. O Bolsa Família também será esquadrinhado – mas, para Haddad, é preciso prioritariamente “aperfeiçoar mecanismos de controle” contra fraudes e distorções no BPC, que terá controle mensal.
A parte mais nebulosa do acordo fiscal envolve as medidas voltadas aos servidores públicos e aos militares. A promessa do governo é revisar rendimentos conforme o “teto constitucional”, atacando privilégios, como as bizarras aposentadorias nas Forças Armadas e os supersalários no serviço público. No entanto, falta clareza sobre o que será feito.
IR
Em contrapartida, haverá uma revisão na tabela do Imposto de Renda (IR): trabalhadores que ganham até R$ 5 mil se tornam isentos – o que deve beneficiar 36 milhões de contribuintes, conforme a Unafisco (Associação Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil). Hoje, a faixa de isenção é de R$ R2.259,20 para quem ganha.
A fim de promover a “correção da injustiça tributária” e compensar a perda, a proposta é elevar o IR de quem ganha, mensalmente, mais do que R$ 50 mil. Haddad sinalizou que “corrigir excessos” virou o mantra.
Pode ser uma parte louvável do pacote. Mas o conjunto das propostas frustra os apoiadores do governo Lula. Ampliar a isenção do imposto de renda era um compromisso de campanha na eleição presidencial de 2022.
O programa de governo, porém, não previa nada sobre um ajuste fiscal ao gosto do mercado financeiro. A noite é de revés para os trabalhadores e o campo progressista