A vida é realmente muito estranha. Ninguém jamais disse que não haveria dor, que não surgiriam espinhos no caminho, que tudo seriam flores. Viver é uma atitude de risco! Quem vive realmente assume o risco de ferir e ser ferido, mas não decide ser vítima das circunstâncias! Decide, isto sim, passar por cima das adversidades, dos sofrimentos, das tormentas, da ausência de saúde. É sobre esse último ponto que quero focar nesta breve loa à vida.
Só quem passa por um problema de saúde sabe o quanto somos frágeis e impotentes. É estranha a capacidade do ser humano em minimizar a dor alheia e potencializar a sua. Ao fomentar a busca pela cura, sempre pedimos a resposta santa aos nossos iguais, mas nos esquecemos de nossas imperfeições refletidas diariamente em nossas ações.
Quando a vida nos impõe um câncer, um AVC, uma doença cardíaca, um acidente, enfim, algo relacionado à saúde, por mais instruído e abastado, o ser humano se abala, se fragiliza, se ressente. A primeira coisa que todos pensamos é: onde posso encontrar socorro? Quem poderá ajudar a reverter o mal? A quem irei confiar meu filho, meu pai, minha esposa, meu irmão, meu ente tão querido? Onde realmente me sentirei seguro em relação à ajuda que irei receber? Só quem já passou por um problema de saúde, próprio ou de alguém próximo, vai realmente compreender as angústias dos momentos que antecedem a chegada de ajuda profissional.
Acabo de sair da missa em ação de graças aos 146 anos da Santa Casa de Montes Claros. Pouco antes do término da celebração, ocorreram alguns testemunhos de pessoas que, acometidas por algum tipo de doença, foram socorridas naquele hospital, dentre elas destaco minha querida professora dos tempos de Escola Normal, Beatriz, além do amigo e advogado Deosvaldo Pena. Ouvimos relatos emocionantes a respeito de um trabalho técnico e sobretudo humanizado. O sentimento de gratidão era latente.
Confesso que iria falar sobre outro tema essa semana, mas me senti obrigado a escrever sobre a santidade e a grandeza que prepondera na Santa Casa, instituição que realiza mais de 100 mil procedimentos por mês, em atendimento a demandas de toda a macrorregião norte de Minas Gerais, além dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, sem olvidar de parcela significativa da população oriunda do sul da Bahia, que aqui vem buscar saúde.
Caro leitor, santidade é sinônimo de benevolência, caridade, piedade, virtude, amor ao semelhante. Vivemos hoje em um Brasil que sangra. Em que a saúde pública carece de um olhar bem mais atento de nossas autoridades. Os corredores estão lotados, faltam leitos, remédios, equipamentos. Os recursos são poucos ou chegam atrasados, são retidos ou bloqueados. A saúde, combalida, padece! O doente precisa de atendimento! A porta de entrada da imensa maioria é a Santa Casa! Estive por lá essa semana, percorrendo as galarias do hospital! Vi e ouvi! Alegrias e tristezas!
Aos olhares não tão atentos ou daqueles que ali estão em busca desesperada de uma cura, observei pessoas maravilhosas, santos anônimos que, diuturnamente, fazem da Santa Casa um lugar efetivamente sagrado. São colaboradores, voluntários, benfeitores, funcionários, todos servidores de uma Instituição que merece toda dádiva ante aos seus 146 anos! Seja na zeladoria, na enfermaria, em seus médicos ou nos setores administrativos! Todos preocupados em simplesmente servir àqueles que ali se encontram, de forma humana, singela, acolhedora! Quem já padeceu por saúde enxerga o que estou falando!
A saudosa Irmã Beata, nascida na Holanda em 29 de janeiro de 1879, morou nas dependências da Santa Casa, juntamente com outras cinco irmãs, e sempre, com o coração aberto e humilde, atendeu aos mais necessitados. Não sem razão, sua trajetória de vida se confunde com a própria história da Instituição, particularmente em razão do amor ao próximo e da eterna busca em socorre-lo da melhor forma possível.
É evidente que nem tudo são flores! Falhas pessoais acontecem! Quem dera todos que ali adentrassem fossem milagrosamente curados. O corpo é falível, amigos! A alma falece! Sim, temos aqueles que perderam seus parentes, situação em que todo o trabalho realizado não foi suficiente para fazer perdurar a vida. Mas ali é o lugar de limiar entre esta e a morte! A linha tênue desse binômio paradoxal que abala aquela casa todos os dias. Nesse embate, a vida tem sobressaído! Nascimentos são feitos, cânceres são extirpados, transplantes são realizados, seres humanos são salvos.
A santidade da Santa Casa passa por cada um daqueles que ali se encontram, por cada espaço, equipamento, medicamento. Do nascimento à morte em um piscar de olhos. A instituição Santa Casa, assim, deve ser fortalecida, exaltada pelo trabalho ímpar que faz em nossa região. Deve ser valorizada como patrimônio social de nossa cidade. Estou certo de que a Irmã Beata, precursora dessa nobre Instituição, transmitiu a cada um de nós, digna e grandemente, a importância da Santa Casa. Só não vê quem não quer! Ou aqueles miseráveis que ainda insistem em distorcer a imagem do real!
“Os homens têm menos escrúpulos em ofender quem se faz amar do que quem se faz temer, pois o amor é mantido por vínculos de gratidão que se rompem quando deixam de ser necessários, já que os homens são egoístas; mas o temor é mantido pelo medo do castigo, que nunca falha”! Em cada nascimento, em cada partida, em cada sorriso, em cada angústia solucionada, não temos a menor dúvida em dizer: A SANTA CASA É SANTA! PARABÉNS PELOS SEUS 146 ANOS!
* Marcelo Eduardo Freita é Delegado de Polícia Federal e Professor da Academia Nacional de Polícia