O cérebro reptiliano dos seres humanos, segundo os especialistas, é responsável pelos comportamentos violentos, irracionais, imprevisíveis, temperamentais dos indivíduos.

Corresponde à parcela da essência do réptil que existe no ser humano, na sua trajetória evolutiva. Estaríamos vivendo uma época em que a essência do réptil prevalece sobre as ações de milhões de brasileiros?
Há pouco mais de um ano, fiquei bastante impressionado quando dois antigos colegas de trabalho discutiam eufóricos, no Facebook, as qualidades do governo Bolsonaro.
Elogios de um lado, elogios do outro, de repente um deles se referiu a mim, no meio do diálogo; disse algo mais ou menos do tipo: “Não diga isso ao fulano, porque ele vive criticando e não acredita que o Mito vai consertar este país!”, ao que o outro respondeu apenas com um emoji de arma com os dedos – gesto que se tornou símbolo característico desse governo.
Não era preciso dizer mais nada para que se entendesse sobre de que o velho colega estava falando ao responder com aquele símbolo. Era a expressão típica da ideia contida no antigo bordão “Para os amigos pão, para os inimigos pau”, dos chefes políticos da época do coronelismo da República Velha, retratado com maestria por Vítor Nunes Leal em “Coronelismo, enxada e voto”, lançado em 1949. Ali estava mais um dos vários sinais do recrudescimento do ultraconservadorismo intolerante, insensato e violento no país.
Já tive oportunidade de falar desse fenômeno no meu livro “O conservadorismo descortês e hostil de Bolsonaro é endêmico”, publicado nos formatos impresso e e-book no site www.amazon.com.
1 O subtítulo sintetiza o conteúdo do livro: “O presidente abriu as compotas de sentimentos que jaziam camuflados em grande parte da população brasileira”. Para entender um pouco do que acontece no íntimo das pessoas que agem assim, fomos beber na fonte da Psicanálise Reichiana que, por tabela, nos remeteu à Neurociência de Mac Lean.
Paul Mac Lean (1913-2007), médico estadunidense neurocientista, teorizou, em 1946, que o ser humano possui um cérebro trino, isto é, dividido em três partes distintas, que definem o comportamento dos indivíduos: cérebro reptiliano, cérebro límbico e cérebro neocórtex. A base da estrutura cerebral constitui o cérebro reptiliano, a parte central, logo acima, é o cérebro límbico, e a parte superior, rugosa, constitui o cérebro cortical, ou neocórtex.
O cérebro reptiliano corresponde ao cérebro dos répteis, que agem única e exclusivamente em função da  sobrevivência: sempre prontos para fugir ou enfrentar o perigo, real ou não, comer, dormir, procriar. O cérebro límbico é onde se concentra as emoções, os sentimentos. O cérebro neocórtex é o responsável pela razão, inteligência, capacidade de análise e confrontação de ideias.
O normal é que os três cérebros atuem em equilíbrio, sem a prevalência de um sobre o outro. Se isso acontece, temos um indivíduo equilibrado, sensato, dotado de sensibilidade e empatia. Quando um deles se sobressai o indivíduo tende a ter comportamentos característicos do cérebro em evidência: o neocórtex leva o indivíduo a se tornar excessivamente racional e o límbico excessivamente emotivo. O reptiliano, merece destaque nesta abordagem: quando ele prevalece sobre os outros, o indivíduo se torna irracional, agressivo, insensível, egocêntrico, capaz de não medir esforços para conseguir o que quer. Os psicopatas, assim como os psicóticos, são tipicamente reptilianos – vale destacar, contudo, que nem todo reptiliano é psicopata, mas todo psicopata é reptiliano.
Se avaliarmos a endemia do ultraconservadorismo descortês e hostil que tomou conta do Brasil nos últimos dois ou três anos, tomando por base a prevalência do cérebro reptiliano nas ações de indivíduos agressivos, intolerantes, violentos, capazes de ferir e até aniquilar quem pensa diferente deles, diríamos que o Brasil vive uma Era Reptiliana.
Ou seja, temos alguns cérebros reptilianos comandando a nação, e milhões de outros, não só apoiando ações estapafúrdias, mas prontos para fazer o sangue dos opositores jorrar. E o pior, são capazes de fazer tudo isso em nome de Deus, numa aliança sanguinária entre católicos fundamentalistas e os denominados “terrivelmente evangélicos”.
É óbvio que por trás de tudo temos as questões culturais que nos guiam. A herança da mentalidade colonial portuguesa, temperada pelo Catolicismo medieval, permanece até nossos dias, ainda que com novos disfarces. O conservadorismo lusitano se fortaleceu no Brasil, ganhou vida própria. Um ponto interessante, porém, é que os portugueses trouxeram uma mentalidade arcaica para formar a base da nossa superestrutura (conjunto das ideologias religiosas, filosóficas, jurídicas e políticas de uma sociedade), que aqui está presente até os dias atuais, e eles próprios evoluíram ao ponto de não mais cultivar tal mentalidade.
* Jornalista

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

dois × cinco =