Hoje, (15.12.2023) estamos nos despedindo da extraordinária e amiga, dona Etelvina, mãe de nossa dileta amiga Vilma Lopes, da dócil comerciária Valquíria e de tantos outros filhos seus, e outros acolhidos com o mesmo amor, de seu marido que era viúvo, entre eles o glorioso Tuca Porreta.

     De origem humilde e que se tornou ainda jovem, uma mulher casada e responsável, numa quadra em que as mulheres, quando devia preencher algum documento não tinham opção, o jeito era escrever na linha destinada à profissão: “prendas domésticas”.

      Contudo, dona Etelvina, uma mulher forjada de grandes virtudes femininas, incluindo-se a castidade, a fidelidade, a modéstia, e a guarda da honra. Enfim, condições intrínsecas femininas de antanho. Cabia à mulher preservá-las, difundi-las ou defendê-las até a morte, como “Sentinelas do Lar”. Por isso se pensava, ou se dizia: “em homem nada se pega”.

     Eram, no entanto, todas elas felizes criaturas que ficavam o dia inteiro no lar, arrumando as tantas camas dos filhos, do casal e visitantes, dando os dificultosos banhos, preparando os filhos para as escolas, costurando roupas das crianças, pregando botões, fazendo crochê, varrendo e lustrando o chão, fazendo o primeiro café, mexendo o feijão e o arroz, preparando chás de tantas ervas, para amenizar ou curar as gripes bravas da meninada. Uma carreira duríssima, mas saudável.

Não havia de que se queixarem, tais mulheres dessa época. Não havia direitos a reclamar, não havia senão que agradecer e bem servir: na mesa e na cama, na riqueza e na pobreza, na saúde e na doença, para sempre, eternamente, amém.

     Loas para dona Etelvina, e que nem mesmo teve tempo de parar e pensar na própria mulher como um todo. Nunca e nada soubera de Schopenhauer, e muito menos do que ele dissera: “a mulher é um animal de cabelos longos e ideias curtas”. Conceito então machista e desmentido pelos tempos modernos ou pela chamada Revolução Feminina.

      A senhora, nesta quadra triste de despedidas, reafirmamos, labutou ou trabalhou muito, com esforço e perseverança, como uma verdadeira esposa e mãe grande, servindo ao marido, na educação, na criação e no encaminhamento de sua enorme prole, para o enfrentamento das vicissitudes, que a vida oferece a todos nós os mortais. E viu depois, o tempo passar na janela, como diz a música,“Karolina”, de Chico Buarque, trazendo no seu bojo, ou consigo, uma gama de direitos femininos.

Tais vantagens ou mesmo igualdades, inseridas ao almejado e realizado universo feminista, acabaram por gerar tributos pesados: as imensas preocupações e disputas com os empregos, a auto estima, a auto imagem, os horários, as locomoções no trânsito infernal, os aborrecimentos nas contas correntes, nos negócios complicados, nos planos da internet e celulares, na pouca segurança pessoal, no medo da depressão, na busca incessante do príncipe encantado, nas feiras intermináveis nos supermercados, na frequência nos salões de beleza com horários rígidos, nos juros escorchantes dos bancos, na notícia de inflação  nos jornais noturnos das tvs, da corrupção sistêmica no país, assim como nos problemas provocados pelas tantas profissões, mesmo os mais comezinhos e corriqueiros. Enfim, são as cobranças das conquistas conseguidas com hercúleos esforços, pelas mulheres modernas.

 Assim, mesmo com os percalços atrelados ao mundo trepidante de hoje, valeu a grande e merecida conquista delas, na igualdade de espaço, dentro de um então sistema masculino e dominador.

       Adeus, dona Etelvina, que nos legou infindos exemplos e nos deixou, nos estertores da noite de ontem. Dela e eternamente, ficará uma eterna imagem de uma digna e verdadeira Mulher Sertaneja e do Lar!

*  José Henrique Brandão (Juca Brandão) é jornalista, advogado, historiador e escritor

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