Levantamento feito por repórteres da Folha em documentos dos 28 anos de atuação de Bolsonaro na Câmara revela modelo de gestão usado para fraudar cofres públicos com contratação de pelo menos 350 assessores em cargos comissionados no período
Ao menos nove ex-assessores investigados no suposto caso das rachadinhas no gabinete de Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), que foi comandado por Fabrício Queiroz, foram empregados em cargos comissionados pelo pai, Jair Bolsonaro, durante os 28 anos em que o presidente atuou como deputado federal.
As informações são de Ranier Bragon e Camila Mattoso, na edição deste domingo (5) da Folha de S.Paulo, que fizeram uma investigação detalhada dos documentos relativos às quase três décadas de mandato parlamentar do atual presidente, que ocupou gabinete na Câmara entre 1991 e 2018, quando se candidatou à Presidência.
A análise mostra que Bolsonaro empregou cerca de 350 funcionários em cargos comissionados e, segundo os jornalistas, revela um “modelo de gestão” que “incluiu ainda exonerações de auxiliares que eram recontratados no mesmo dia, prática que acabou proibida pela Câmara dos Deputados sob o argumento de ser lesiva aos cofres públicos”.
Parte desses assessores estariam agora atuando nos gabinetes de Flávio no Senado e dos irmãos, o deputado federal Eduardo Bolsonaro e o vereador Carlos Bolsonaro.
Entre os assessores contratados por Bolsonaro está Nathália Queiroz, filha de Fabrício Queiroz, que teria passado por oscilações salariais no gabinete até ser demitida, em 15 de outubro de 2018, mesmo dia em que seu pai foi exonerado por Flávio. Ao mesmo tempo em que Nathália estava registrada como assessor de Bolsonaro em Brasília, ela dava aulas como personal trainer no Rio de Janeiro.
A reportagem cita ainda Walderice Santos da Conceição, a Wal do Açaí, que seria a recordista das movimentações, passando por 26 alterações de cargos no gabinete de Bolsonaro entre 2003 e 2018.
Entre os assessores investigados no caso das rachadinhas de Flávio Bolsonaro, está Marselle Lopes Marques, que ficou lotada no gabinete de Bolsonaro em 2004 e 2005, entrando com um salário de R$ 261 à época.
Três meses depois, foi mudada de cargo e dobrou a remuneração. Com um ano, passou a ganhar o maior contracheque entre todos os assessores, R$ 6.011. Três meses depois, o salário foi cortado em 90%.
De acordo com a reportagem, essa montanha-russa funcional se dava por meio de exonerações de fachada, em que o auxiliar tinha a demissão publicada e, no mesmo dia, era renomeado para o gabinete, geralmente para outro cargo.
De acordo com o ato da mesa da Câmara 12/2003, a prática tinha como único objetivo forçar o pagamento da rescisão contratual dos assessores, com 13º salário proporcional e indenização por férias, não raro acumuladas acima do período permitido em lei.
A partir de 2 de abril de 2003, a Câmara passou a só permitir a readmissão após 90 dias da saída e acabou com o pagamento de rescisão para trocas de cargos, que passaram a ser feitas pelos parlamentares sem necessidade de exoneração.