– CORONAVÍRUS: POUCO CASO DE BOLSONARO PODE CUSTAR 478 MIL VIDAS AO BRASIL –
PESQUISADORES DA UNIVERSIDADE DE OXFORD, no Reino Unido, publicaram neste domingo um estudo preliminar calculando e comparando as prováveis mortes pelo novo coronavírus no Brasil e na Nigéria. Aqui, de acordo com a projeção, deve haver até 478 mil mortes. Trata-se de um preprint, ou seja, um estudo que ainda não foi revisado por outros pesquisadores, nem validado por uma publicação científica, mas que é antecipado para acelerar a circulação de informações de interesse público em emergências – exatamente como a crise que estamos vivendo.
“Esse processo de peer review [revisão por colega] leva meses, então acaba retardando o processo de disseminação da informação”, explicou ao Intercept Jadel Kratz, gestor de pesquisa na Drugs for Neglected Diseases initiative, uma ONG que pesquisa medicamentos e vacinas para doenças negligenciadas pela indústria farmacêutica por não darem lucro.
Como se trata de um estudo preliminar, ele ainda será discutido pela comunidade científica nos próximos dias. É possível que os autores decidam fazer correções na sua versão final. Por isso, é necessário olhar para os números com cautela.
Para chegar aos números, os pesquisadores analisaram a proporção entre jovens e idosos da população de vários países. O novo coronavírus é particularmente fatal para a população mais velha. Para entender o padrão de mortalidade da doença, os cientistas analisaram dados da Itália, onde 1.809 pessoas já morreram, e da Coreia do Sul, que, apesar de ser a quarta nação mais afetada do mundo, com mais de 8.200 casos, teve apenas 75 mortes.
A população dos dois países é parecida em números absolutos, mas diferente em estrutura demográfica: a Coreia do Sul tem mais jovens, e a Itália, mais velhos. Analisando os padrões de letalidade da doença, os pesquisadores projetaram seus efeitos nos países que ainda não chegaram ao pico dramático da pandemia – caso do Brasil.
Aqui, 2% da população têm mais de 80 anos. Embora qualquer pessoa a partir de 60 anos já seja considerada vulnerável, é esse o grupo que corre maior risco de vida com a Covid-19, a doença provocada pela nova variedade do coronavírus, que começou a se espalhar na China e já contaminou mais de 160 mil pessoas no mundo e matou outras 6 mil. Analisando a taxa de mortalidade da doença em diferentes idades e fazendo as projeções para cada população, os pesquisadores chegaram ao cenário de possíveis 478.629 mortos no Brasil, número maior que o da Nigéria, que tem uma população mais jovem.
A pesquisa parte do princípio de que 40% da população de cada país será infectada pelo novo coronavírus. A porcentagem é baseada em uma outra pesquisa, da Universidade de Harvard, nos EUA, que afirma que a proporção de contaminados em escala global será de 40% a 70%. É uma premissa razoável, considerando que especialistas indicam que a Alemanha, com pouco mais de um terço do número de contaminados na Itália, atual epicentro da pandemia, terá até 70% de seus habitantes infectados.
O negacionismo de Bolsonaro diante dos perigos do coronavírus é catastrófico.
“Hipóteses podem ser ajustadas, mas a forte relação entre a estrutura demográfica de uma população e o número de mortes se mantém”, escreveu uma das autoras da projeção, Jennifer Dowd. “Isso deve afetar a intensidade necessária das medidas tomadas em uma população para reduzir o número de casos mais críticos e a sobrecarga do sistema de saúde”.
Numa troca de e-mails com o Intercept, Dowd explicou que a pesquisa não estima em quanto tempo esse número seria atingido. “É óbvio que medidas de contenção podem reduzir esse número, mas escolhemos [usá-lo] como uma ilustração do que é possível”, escreveu a pesquisadora de Oxford, especialista em demografia e saúde populacional. Dowd nos explicou que o estudo não têm condições de projetar qual seria a redução de mortes caso o governo tome medidas intensas, como o isolamento compulsório da população.