À direita, ao lado do filho, o médico e empresário deixou um legado marcante, sendo lembrado por sua honestidade e empreendedorismo. (Arquivo pessoal)

Quem chega a Montes Claros por via aérea desembarca no Aeroporto Mário Ribeiro da Silveira. Caso a chegada seja por via terrestre, é possível passar pelo imponente Hospital das Clínicas Doutor Mário Ribeiro da Silveira (HCMR). Percorrendo o centro, vai se deparar com um edifício de quarteirão inteiro no coração de Montes Claros, denominado Shopping Popular Mário Ribeiro. Na mesma praça do Shopping está o edifício Ciosa, o mais antigo da cidade. Mais adiante, na mesma rua, paralela à lateral do shopping, ainda resiste a construção em que funcionou o antigo Cine Montes Claros, hoje uma loja de departamento. De norte a sul da cidade, o médico Mário Ribeiro deixou sua marca. Nascido em 23 de setembro de 1924, o filho da professora Mestra Fininha (Josefina) e Reginaldo Ribeiro, ambos nomes de ruas na cidade, estaria completando 100 anos este mês. O saudoso Mário, que partiu em 1999, aos 75 anos, é lembrado com respeito e reconhecimento por aqueles que partilharam do seu convívio.
Para o historiador Wanderlino Arruda, Mário Ribeiro é uma das personalidades mais importantes da história de Montes Claros e presença indispensável nos principais acontecimentos econômicos, sociais, políticos e culturais da sua época. Wanderlino lembra que ele nasceu em uma casa na esquina das ruas Doutor Santos e Dom João Pimenta e ali residiu por muitos anos, antes de se mudar com a família para a Rua Cel. Luiz Pires. Casado com Maria Jacy de Oliveira Ribeiro, constituiu uma família numerosa. “Conheci o Dr. Mário Ribeiro como médico e como membro do Rotary Clube de Montes Claros, nas reuniões no antigo Hotel São Luiz, início da Rua Doutor Santos, quando lá pensava e trabalhava tudo de importante para a cidade e região” conta Wanderlino, lembrando que Mário, além de médico, era empresário dos setores de cinema e curtume, antes mesmo de ingressar na política. “Líder o tempo todo, estava presente em tudo. Foi ele o idealizador e construtor do primeiro edifício de muitos andares em Montes Claros, o Edifício Ciosa (entre a Praça Doutor Carlos e a Rua Lafetá), o primeiro com instalação de elevador”, relembra. Sobre o amigo, Wanderlino pontua que resumidamente era um cidadão e um político, sempre reconhecido como honesto e empreendedor.

VIDA POLÍTICA
Nas décadas de 1950 e 1960, Mário Ribeiro foi vereador e candidato a vice-prefeito. Em julho de 1969, durante a ditadura, foi cassado e perdeu os direitos políticos. Em consequência, foi perseguido e demitido da direção da Faculdade de Medicina, do cargo de professor titular da cadeira de Dermatologia e do cargo de Médico Sanitarista do Estado de Minas Gerais.
“Ele sofreu muitas perseguições políticas, quando, embora com muito sofrimento, superou todas as dificuldades e manteve com normalidade a família, os seus negócios e a vida médica”, recorda Wanderlino, destacando que, no período em que Darcy Ribeiro, irmão de Mário, era Chefe da Casa Civil, em Brasília, chegou a correr notícia de sua possível nomeação para o Ministério da Saúde, o que acabou não acontecendo. “Exilado Darcy, no Uruguai, Mário chegou a conviver com ele lá, por algum tempo”.
Com a anistia de 1979, Mário Ribeiro recuperou seus direitos e enveredou novamente na política. Foi vice-prefeito (1982 a 1988), secretário de Estado do Trabalho e Ação Social (1986) e prefeito de Montes Claros (1989 a 1992). Foi também o primeiro presidente da pioneira indústria incentivada pela Sudene na região-Frigorífico Norte de Minas (Frigonorte); viabilizou a construção do ginásio esportivo do Montes Claros Tênis Clube, hoje Ginasium Darcy Ribeiro; lutou pela implantação e construção da Escola Estadual Professor Plínio Ribeiro; apoiou a Construção do Estádio João Rebello; foi presidente da Associação Desportiva Ateneu; diretor dos “Cinemas Norte de Minas S/A”, empresa que detinha 16 salas de exibição em 14 cidades do Norte de Minas; diretor-executivo do Curtume Montes Claros; primeiro presidente do Automóvel Clube de Montes Claros, entre outras atividades.

LIVRO
Para o antropólogo João Batista Almeida Costa (Joba), ainda são poucas as homenagens ao ilustre montes-clarense. “Falta uma estátua dele e de Darcy. Idealizei essa estátua na pracinha da Unimontes e na Avenida que dá acesso ao Campus e que leva seu nome”, diz Joba, que acaba de organizar um livro de 192 páginas em sua homenagem.
O livro “Marão — Mário Ribeiro, Um Visionário Progressista do Norte de Minas”, será doado às bibliotecas de ensino médio e faculdades e universidades, “para que, no futuro mais distante, quando as pessoas pesquisarem quem é essa pessoa que dá nome a tantos locais da cidade saibam a grandeza de Mário. Esse reconhecimento faz jus à pessoa dele”, diz Joba, que foi o escolhido pela família de Mário para a missão. Com laços estreitos com a família, o antropólogo conheceu Mário ainda na infância, em Jequitaí, quando seu pai recebia a visita de Mário em casa. Joba pontua que sempre admirou o ex-prefeito pela sua serenidade, generosidade e bondade. “Essa visão que eu tinha dele se confirmou. Muita coisa que aconteceu no Norte de Minas teve o dedo do Dr. Mário. Foi ele quem deu partida para a criação da Faculdade de Medicina e, além disso, criou o sistema de bolsa de estudo para estudantes carentes, que se tornaria o Fies. Propôs o concurso nacional de vestibular, que se tornaria o Enem. Era um visionário com uma personalidade fantástica”, disse Joba.
Com acesso a diversos arquivos e registros fotográficos que utilizou na confecção do livro, Joba avalia que Mário era uma figura amada por toda a cidade. Mas isso não o livrou de perseguições e esse amor foi colocado de lado em nome de interesses que uma camada da população montes-clarense defendia. “Montes Claros é uma cidade extremamente conservadora e, no período da ditadura, houve maldade em torno da família”, relata. E ressalta que trechos do livro contam esse e outros capítulos da história.

PAI AMIGO
De maneira amorosa e visivelmente emocionada, Mário Ribeiro Filho, o Ucho, diz que é sempre com alegria que relembra o pai. Desde pequeno, ele conta, tinha verdadeira adoração pelo jeito expansivo, alegre e solidário de Marão. “A palavra que mais define papai é ‘amigo’. Ele gostava dos amigos, vivia em função deles e a outra coisa de que ele mais gostava era Montes Claros. Ele acreditava na cidade, no povo e no Brasil. Achava que o Brasil tinha jeito”, destaca Ucho, que também seguiu os passos de Marão e foi vice-prefeito da cidade. “Papai era amor, afeto, perdão. Foi muito perseguido, mas não tinha raiva de ninguém e não guardou mágoa. Era feliz e amava Montes Claros”, resume Ucho.
Via: O Norte

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