Antes de se dirigir ao local da execução de Marielle e Anderson, acusados passaram pelo condomínio Vivendas da Barra, onde moram Jair e Carlos Bolsonaro, diz “JN”
Bolsonaro dirigiu ameaças à Globo por revelar trechos de inquérito que corre sob sigilo de Justica
São Paulo – Em 14 de março de 2018, dia do assassinato da vereadora Marielle Franco (Psol), do Rio de Janeiro, e do motorista Anderson Gomes, um dos suspeitos do crime teria entrado no condomínio Vivendas da Barra, pedindo para ir à unidade 58, onde mora Jair Bolsonaro. Segundo depoimento do porteiro, “seu Jair” teria atendido o interfone autorizando a entrada, mas o carro de Élcio Queiroz teria se dirigido à casa de Ronaldo Lessa, suposto autor da execução.
As informações foram tema de reportagem do Jornal Nacional, da Rede Globo, na noite desta terça-feira (29). O jornal informou que, naquele 14 de março, Bolsonaro estava na Câmara dos Deputados, em Brasília. E que a citação do nome do presidente pode levar o caso a ser investigado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Cerca de meia hora depois da reportagem, Jair Bolsonaro fez uma live em sua página no Facebook. Durante 23 minutos, o presidente atacou a Globo e mais de uma vez mencionou o fato de que a TV terá de renovar sua concessão em 2022. O presidente da República, muito alterado, falou em perseguição e usou várias vezes o termo “patifaria” para se referir à Globo.
Algumas frases de Bolsonaro dão aparência de um suposto descontrole. O risco de uma live é se expor a contradições. Bolsonaro caiu em contradições, usou palavras de baixo calão e alternou momentos de calma com destempero.
Nos primeiros 10 minutos, tinha 40 mil observadores. O volume da audiência ia subindo, e o tom de voz de Bolsonaro subia junto. Em determinados momentos, punha os óculos, como que alterando o ponto de visão. Como se recebesse alguma orientação de alguém que o dirigisse para que elevasse o “descontrole”. Pausas davam a impressão de que recebia alguma mensagem, escrita ou falada. E xingava muito. Até a pronúncia errada do nome, “Mariella”, era repetida.
Calculada como as menções a Adélio Bispo, o autor da suposta facada que o tirou da campanha para colocá-lo no topo da disputa eleitoral. Lembrou que Adélio foi filiado ao Psol e que gostaria que seu crime fosse melhor investigado. Isso no mesmo dia em que a bancada do Psol travou na Câmara uma batalha em defesa das aposentadorias e pensões do baixo escalão do segmento militar, apoiadores de Bolsonaro que o classificaram de traidor, e que acabou em privilégios reservados ao pessoal de alta patente.
Bolsonaro manteve o tom elevado quando a audiência chegava perto de 105 mil views, e a curva começou a descer. Seria o ápice.
“Parem de trair o brasil. Vocês não estão traindo a mim, estão traindo o Brasil”, disse, avisando à Globo que acabou a “mamata”, lembrando o fim do aporte de “bilhões” em publicidade estatal.
“Peço ao Conselho do Ministério Público que supervisione esse processo, o meu e o do Flávio. E vejam as ilegalidades. Estão investigando também meu filho Eduardo, o Carlos melhor dizendo. Informações da minha família do Vale do Ribeira, foram investigados… Esculacharam a avó da minha esposa, que foi presa por tráfico. Foi presa sim por tráfico, uma senhora que está com 80 e poucos anos de idade. Faz a covardia com ela para atingir minha esposa. O que minha esposa tem a ver com a avó dela que foi presa sim por tráfico? Também a acusação da mãe da Michele, que tem problema na Justiça com falsidade ideológica. Teve sim problema, mas por que essa exposição? A mesma revista Época é a fonte das mentiras, dos fake news contra minha família”, disse, reconhecendo os crimes de que são acusados alguns de seus familiares.
“Vocês apostaram me derrubar no primeiro ano e não conseguiram”, disse à Globo o presidente que completa 10 meses de governo esta semana.
“Estou fazendo uma viagem de sacrifício, 10 dias longe da família, ralando o dia todo. E vocês, Rede Globo, o tempo todo infernizam a minha vida, porra”, espumou o presidente da República, que desde o último dia 21 se encontra em viagem iniciada pelo Japão, passando pela China, Emirados Árabes e Arábia Saudita, em encontro com príncipes em hotéis cujas diárias chegam a R$ 35 mil.
“Se vocês tivessem o mínimo de decência, por saber que o processo corre em segredo de Justiça, não poderiam divulgar. O caso Flávio é a mesma coisa: é laranjal, laranjal, laranjal o tempo todo”, disse, perturbado com a investigações que tratam de caixa 2 no seu partido, o PSL, e da coleção de funcionários fantasmas ligados a seu gabinete, de seu filho, e da relação destes com sua família e sua história política no estado do Rio de Janeiro.
Insinuou que os vazamentos das informações poderiam ter a mão do governador Wilson Witzel (PSC), que comanda o sistema de segurança do Rio. Endereçou ao governador, pretenso candidato presidencial em 2022, algo parecido com um recado: só venceu a eleição por estar “colado” em Flávio o tempo todo durante a campanha em 2018.
“É um desgaste pra todo mundo da minha família, todo mundo é suspeito na minha família. Querem prender um filho meu. Quando prender um filho meu, vão estar satisfeitos. Quem sabe agora ele capture, venha conversar conosco. Não vou conversar com vocês da TV Globo”, afirmou, apesar de, durante a mesma live, ter criticado a repórter Delis Ortiz, que faz a cobertura da viagem presidencial para a Globo, por não ter tentado ouvi-lo sobre a reportagem que seria veiculada pelo Jornal Nacional.
“Temos uma conversa em 2022. Tenho de estar morto até lá. Porque o processo de renovação da concessão não vai ser perseguição. Nem para vocês, nem para TV, nem rádio nenhuma. O processo tem de estar enxuto, tem de estar legal. Não vai ter jeitinho para vocês nem para ninguém. É essa a preocupação de vocês? Continuem fazendo essa patifaria contra o presidente Jair Bolsonaro e sua família. Continua, TV Globo. Vocês já perderam a credibilidade no Brasil.”