“Esse mal, que tem suas próprias variantes, é obra de um clã. Associado ao distanciamento, ao negacionismo, à desinformação, à mentira”, diz o ex-jogador do São Paulo e do Paris Saint-Germain, sem citar Bolsonaro

Em longo artigo publicado no jornal Francês Le Monde, o ex-jogador de futebol Raí, que fez história e se transformou em ídolo no Paris Saint-Germain, afirma o Brasil e os brasileiros estão vivendo um “duplo flagelo”.

“Brasileiro que sou, como tantos outros, encontro-me assediado, nestes tempos sombrios, por um duplo flagelo cujas devastações são apenas o acréscimo de nossos próprios erros coletivos. Além da ‘praga’ biológica, essa epidemia tão mal administrada que causou a mais grave crise de saúde da história do meu país, estamos sofrendo outro mal, muito mais mortal no longo prazo”, escreve Raí, referindo-se à ameaça à democracia, mas sem citar Jair Bolsonaro (Sem partido).

“Esse mal, que tem suas próprias variantes, é obra de um clã. Associado ao distanciamento, ao negacionismo, à desinformação, à mentira, acaba suprimindo, ainda que temporariamente, nossa revolta, nossa resistência e nossa indignação”, afirma ele, que é irmão de Sócrates, que fez história na luta contra a ditadura na Democracia Corinthiana.

Antes, Raí lista uma série de ações desencadeadas no governo Bolsonaro que colocaram o Brasil como pária internacional e alvo de críticas no cenário global – vindas muitas vezes do presidente francês, Emmanuel Macron.

“Um mal que nos isola diplomaticamente, um mal que atormenta insidiosamente a Amazônia e persegue quem a protege. Um mal que permite a mineração em reservas indígenas, e prefere toras serradas a toras vivas. Um mal castrador das liberdades, que ameaça a democracia e revive censura odiosa, promove a intolerância, a homofobia, o machismo, a violência. Ao aprisionar nossa razão e nosso bom senso, ela nos destrói, incita o ódio, se apresenta como inimiga das artes e da cultura, humilha nossa consciência ao negar a ciência”, escreve o ex-jogador.

Raí descreve os brasileiros como um povo “distraído”, que não presta atenção aos perigos que os ameaçam. “Durante anos, porém, os ratos estiveram ali, mostrando o rosto, revirando os olhos, mostrando os dentes, afiando as garras”, aponta o ex-jogador, numa evocação velada aos militares e fascistas.

O que fazer para se livrar deste pesadelo, questiona o diretor esportivo do São Paulo. Raí reconhece que derrubar o mal não será tão simples, porque o Brasil “carrega nas costas a extrema desigualdade, econômica, social e educacional, que esteriliza os comportamentos e aniquila a vontade de ruptura”. Mas ele aponta algumas prioridades.

Em primeiro lugar, é preciso combater o negacionismo, “lutar contra a estupidez que desencoraja o uso de máscaras” e vacinar a população para vencer a epidemia. Depois, erradicar “a praga maior que gangrena a sociedade”. “É preciso encontrar o antídoto para que não continuemos carregando uma doença que nos destruiria, contra nossa vontade”, enfatiza. “Não queremos, por culpa de alguns criminosos, nos tornar nossos próprios algozes”, conclui.

Via Fórum, com informações da Rádio França Internacional

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

três + catorze =