Imprensa portuguesa critica duramente pedido de prisão de Lula
Editorial do jornal Público.pt de Portugal
Num país com fracturas sociais e políticas cada vez mais expostas, a Justiça devia servir de catalisador de consensos.
A pressa com que o juiz Sérgio Moro decretou a prisão de Lula da Silva, um dia após a polémica recusa do habeas corpus apresentado pela defesa do ex-Presidente, quando em aberto está a possibilidade de ser apresentado um pedido de embargo no tribunal de segunda instância, diz tudo, ou quase tudo, sobre a hegemonia que o sistema judicial tenta conquistar ao sistema político brasileiro. E a prova desta constatação não se deve procurar no labirinto do processo penal, na leitura autêntica da Constituição ou no sagrado princípio da separação de poderes que rege qualquer Estado democrático. Encontra-se em duas e singelas perguntas: porquê a pressa em prender Lula? E para quê?
Lula ainda é o rosto de um partido poderoso, mas a sua condenação por corrupção em segunda instância acabou irremediavelmente com a possibilidade de se candidatar à presidência e, acto contínuo, acabou com a sua carreira política. Tarde ou cedo, à luz da lei Lula acabará na prisão. Acelerar o processo só serve para legitimar as suspeitas sobre um pérfido instinto punitivo e persecutório de Moro, não para mostrar a celeridade ou a imparcialidade da Justiça.
Sendo um activo político com mero valor facial, Lula não deixa de ser um ícone, nem perdeu o estatuto de ex-Presidente. Qualquer juiz de qualquer tribunal deveria ter estes factos em consideração e o próprio Sérgio Moro não se eximiu a essa realidade, impedindo que seja algemado, reservando-lhe uma sala, concedendo-lhe a possibilidade de se apresentar na polícia pelo seu próprio pé.
Então, por que é que Sérgio Moro decide apanhar à pressa a boleia de uma decisão polémica do Supremo Tribunal Federal que, ao recusar o habeas corpus a Lula, se baseou numa jurisprudência duvidosa e recusou analisar o espírito do preceito constitucional que, lá como cá, garante a todos os cidadãos o direito à presunção de inocência até que a sentença transite em julgado? Porque é que não deu tempo a que a defesa esgotasse todos os seus recursos no tribunal de segunda instância, que poderiam ficar decididos já na próxima semana? Por que é que optou por uma atitude drástica em relação a prazos, sabendo que com essa atitude vai afrontar uma parte significativa da população brasileira?
Leia o editorial completo no Público