O símbolo da morte, associado a uma figura portando uma foice, agora está associado a imagem do governo Bolsonaro (Comunicação MST/Fotos Públicas)

Em nome do que ainda resta de humanidade em nós, lutemos sem trégua contra os mensageiros da morte e destruição. Que sigamos firmes

Vivenciar a morte de pessoas próximas desperta emoções, desde dor até serenidade. Entretanto, no Brasil a morte vivenciada de perto por todos nós tem despertado sentimentos que vão da dor, raiva à indignação.

Em pouco mais de um ano, mais de 500 mil brasileiros morreram de uma doença que já tem vacina. Faxineiras, motoristas, funcionários públicos, médicos, empresários, padres, comediantes, políticos, pastores, músicos, escritores, bailarinos, indígenas. Não são apenas cargos ou profissões. Possuem nomes e histórias, Renans, Fernandos, Marias, Paulos e Vanessas… filhos, amigos, pais, irmãos. O sentimento da perda é irreversível. Um país de enlutados!

A morte nos faz refletir. É um processo universal, ocorre com todos os organismos vivos. Existem formas de prolongar a vida e com dignidade. A Covid-19 já possui vacina! Negacionista e mentiroso, corrupto e negligente, o governo brasileiro deixa as pessoas morrerem sem ar, sem medicamentos, sem leitos, sem vacinas. “Toda vida importa”.

Getúlio Vargas, segundo registros, tirou a própria vida e entrou para a história. Bolsonaro entrará para a história como o presidente que atentou contra a vida de seus compatriotas. O símbolo da morte, associado a uma figura portando uma foice, agora está associado a imagem do governo Bolsonaro.

É chocante o marco de 500 mil mortos. Que sábado triste! O que sentimos ao saber que o Brasil ultrapassou a marca de meio milhão de mortos? É como se Juiz de Fora se transformasse em cidade fantasma. A realidade pode ser ainda pior, já que as subnotificações de óbitos podem variar entre 30% e 50% (Rede Análise Covid).

Uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) começa a descortinar o teatro macabro do governo no combate à Covid-19, tratada por gripezinha. Um show de mentiras, três trocas de ministros, previsões errôneas, “gabinete paralelo” composto por negacionistas anticiência e defensores de um tratamento ineficaz. Depoimentos e documentos comprovam a série de descasos do governo. Apurações estão só no início.

Já são mais de 120 os pedidos de impeachment. Arthur Lira e Rodrigo Pacheco, fantoches de Bolsonaro, são cumplices dessa tragédia. Como uma pessoa com tamanho desequilíbrio mental pode se manter na presidência? “A tolerância é um crime quando se tolera a maldade” (Thomas Mann). Enquanto a morte (de pessoas, da democracia, do bem comum, da boa política) for lucrativa, os ricos rejeitarão o impeachment. O Congresso e seus muitos parlamentares corruptos, foi reduzido a mero gestor de verbas.

Com a repercussão das investigações e, diante da pressão popular, o governo esboça agilizar um Plano Nacional de Imunização, mas pode ser tarde. Especialistas preveem uma terceira onda. O custo da pandemia é alto, milhares choram seus mortos, milhões são os desempregados, os desalentados, os de barriga vazia. Uma tragédia humanitária. Bolsonaro não salvou vidas e nem a economia. Não há país que resista.

Qual será o legado que nos deixará a pandemia associada à necropolítica bolsonarista? Cansaço, depressão, tristeza, ansiedade, arrependimento? As ruas provam que algo mudou. Que os brasileiros não aguentam mais. Transformam o luto em luta. “A coragem é a primeira das qualidades humanas porque garante todas as outras” (Aristóteles).

Mas é preciso mais. Em tempos de pandemia a política deveria “pôr a dignidade humana no centro e, sobre este pilar, construir as estruturas sociais alternativas de que precisamos”. Papa Francisco ressalta que um político deve se perguntar:

“Para onde estou realmente apontando? As perguntas, talvez dolorosas, serão: Quanto amor coloquei no meu trabalho? Em que fiz progredir o povo? Que marcas deixei na vida da sociedade? Que laços reais construí? Que forças positivas desencadeei? Quanta paz social semeei? Que produzi no lugar que me foi confiado?” (Fratelli tutti,197).

O bolsonarismo é absolutamente incapaz de se fazer tais perguntas, pois palavras como dignidade, construir sociedade e amor ao próximo não existem em vocabulários de fascistas. Certos conceitos exigem outro patamar de civilidade e inteligência. Despótico descontrolado, Bolsonaro não tira um dia de folga na sua guerra contra o Brasil, a cada dia pior.

A crise sanitária brasileira é uma crise de direitos humanos. Em nome do que ainda resta de humanidade em nós, lutemos sem trégua contra os mensageiros da morte e destruição. Que sigamos firmes. Resistamos, em memória dos que partiram nesta pandemia. Não nos deixemos contaminar pela estupidez da idiocracia descerebrada que nos governa.

Para que este pesadelo acabe, combater a necropolítica do bolsonarismo virou questão de vida! Todo mundo já sabe das atrocidades que acontecem no Brasil. Crimes contra a humanidade, como genocídios, não prescrevem! Que o clamor das vítimas e enlutados chegue aos ouvidos de Deus. Rezemos com Dom Vicente.

*Élio Gasda é doutor em Teologia, professor e pesquisador na Faje. Autor de: ‘Trabalho e capitalismo global: atualidade da Doutrina social da Igreja’ (Paulinas, 2001); ‘Cristianismo e economia’ (Paulinas, 2016)

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