Dom José Maria Pires, o Dom Zumbi, ex-bispo de Araçuaí, morreu aos 98 anos

 Morreu no domingo, 27 de agosto, vítima de pneumonia, o religioso José Maria Pies, 98 anos, arcebispo emérito da Paraíba. Natural de Conceição do Mato Dentro, Dom Zumbi ou Dom Pelé, como era carinhosamente conhecido, foi o primeiro negro a assumir um bispado no Brasil.

Dom José nasceu em 15 de março de 1919, no distrito de Córregos. Ele tinha 70 anos de ordenação sacerdotal e 60 anos de episcopado. Filho de Eleutério Augusto Pires e Pedrelina Maria de Jesus,

Quando jovem, ainda em sua terra natal, teve seus primeiros ensinamentos com o mestre José Aniceto Costa – que dá nome à escola do bairro Vermelho. Durante a infância, aprendeu latim com o professor e, entrou para o seminário em Diamantina, no Vale do Jequitinhonha, aos 12 anos, para continuar seus estudos e fazer o Seminário.

Foi ordenado sacerdote em 20 de dezembro de 1941, e recebeu a ordenação episcopal em 22 de setembro de 1957. Seu lema episcopal: Scientiam Salutis (A Ciência da Salvação).
Sua trajetória foi marcada pela defesa dos negros, dos pobres e dos oprimidos. O bispo mais antigo (em ordenação episcopal) do Brasil, foi bispo de Araçuaí, no Vale do Jequitinhonha, entre 1957 e 1965; membro da Comissão Central da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), presidente da Comissão Episcopal Regional do Nordeste, escritor, palestrante e um dos poucos sacerdotes que participaram do Concílio Vaticano II.
Também se posicionou com firmeza ao lado dos que lutavam pelo fim da ditadura, mas sem perder a singular capacidade que tinha de dialogar com aqueles a quem claramente se opunha.

Dom Zumbi parte definitivamente para os braços de Deus, no mesmo dia (27 de agosto) que outros dois bispos tiveram sua Páscoa: dom Hélder Câmara (27/08/1999) e Dom Luciano Mendes de Almeida (27/08/2006).

Ele uniu a calma do mineiro à franqueza do nordestino para defender os mais pobres durante a ditadura militar. Teve no cearense dom Helder Câmara um amigo pessoal e aliado na luta pelos direitos humanos.

Dom José Maria Pires renunciou em 29/11/1995, mas nunca deixou de atuar, principalmente junto aos mais pobres e na formação do Povo de Deus.

Ele ficou à frente da Arquidiocese da Paraíba, entre 1966 e 1995. Atualmente, era considerado o arcebispo mais velho do Brasil. Durante toda sua trajetória, defendeu arduamente os direitos humanos no país, sobretudo no período de regime militar. Mediou ainda conflitos por terra na Paraíba e lutou contra a discriminação e o racismo.


Caminhada eclesial
Participou do Concílio Vaticano II, entre 1962 e 1965. Transferido para João Pessoa (PB), em 1965, onde ficou mais próximo de dom Helder Câmara, um aliado na luta pelos direitos humanos, teve participação valiosa nos conflitos pela terra na Paraíba, ao defender camponeses.
Participante ativo da luta pelos direitos dos negros, em 2013, publicou o livro “A cultura religiosa afro-brasileira e seu impacto na cultura universitária”. Tornou-se emérito e voltou a ser pároco de Córregos e Santo Antônio do Norte, no Vale do Jequitinhonha, desde 1995, onde se dedicou também a um projeto de geração de renda para centenas de famílias carentes dessa região.
O velório de José Maria Pires foi realizado na Paróquia Nossa Senhora das Dores, em Belo Horizonte.
O sepultamento foi nesta terça-feira, 27 de agosto, em João Pessoa, na Paraíba. Por causa do falecimento, a Prefeitura de Conceição do Mato Dentro decretou luto oficial de três dias.
Homenagem de trabalhadores rurais a Dom Zumbi
“Onde ele estiver, tenho certeza de que estará intercedendo por nós, agricultores”. A declaração é da agricultora familiar Iolanda de Oliveira Monteiro, que junto com outros 120 trabalhadores compareceu ao velório do arcebispo emérito da Paraíba, que aconteceu na Catedral Basílica de Nossa Senhora das Neves, em João Pessoa, nesta terça-feira (29). Durante toda a manhã, fieis se revezaram dentro da igreja para se despedir de ‘Dom Pelé’, como era chamado pelo povo.
O grupo que compareceu ao velório nesta terça-feira reuniu trabalhadores de acampamentos e assentamentos de Jacaraú, Curral de Cima, Sapé, Itabaiana, Mogeiro, Pitimbu, Caaporã, Conde e Pedras de Fogo. Eles participaram de uma das missas de corpo presente realizadas ao longo do dia na Catedral.
Iolanda conta que conviveu com o Dom José durante os 20 anos de luta pela regularização da terra da sua comunidade. Ela lembra que “ele teve uma importância muito grande pelo apoio e solidariedade, por fortalecer nossa fé e a nossa luta exige isso”.
O trabalhador rural Rogério Oliveira destaca que Dom José “sempre foi uma força dentro destas comunidades rurais”. “Temos uma dívida muito grande de gratidão por tudo que Dom José fez pela gente. Ele sempre estava dialogando com a Justiça e com a Polícia para não acontecer conflitos”, destaca. O grupo participou da missa usando chapéus de palha e levando cartazes com fotos de momentos em que o bispo participou nas comunidades.
O corpo de Dom José foi sepultado às 17h na própria catedral basílica, após a Missa das Exéquias, marcada para começar às 16h, presidida pelo atual arcebispo da Paraíba, Dom Manoel Delson.

Fontes: Brasil de Fato e Diocese de Araçuaí.

Comentário do Blog do Banu:
Dom José Maria Pires atuou como Bispo da Diocese de Araçuaí, no dia 25 de maio de 1957 até 02 de dezembro de 1965. quando foi transferido para a Diocese de João Pessoa, onde permaneceu por 30 anos, entre 1966 e 1995, defendendo os trabalhadores rurais, os pobres e negros, contra a opressão da ditadura militar.

Na minha infância, em Berilo, no Médio Jequitinhonha, enchíamos a praça do então distrito de Minas Novas, para receber Dom José Maria Pires, o primeiro bispo negro do Brasil, com a criançada irradiando alegria pela chegada de um religioso diferente, simpático, sorridente, amigo das crianças e jovens.

As comunidades quilombolas se animavam na Festa de Nossa Senhora dos Homens Pretos de Berilo, no mês de outubro, com seus tambores, batuques, roupas coloridas, cheias de vestimentas de reinado, tendo como animador da festa religiosa um bispo negro, amigo dos pobres e oprimidos.

As 27 comunidades quilombolas, principalmente da região do Caititu (Mocó, Caititu, Água Suja, Água Limpa, Engenho Velho), da Vila Santo Isidoro, Roça Grande, Brejo e Lagoa Ezequiel, traziam seus tachos de doces e biscoitos de goma, com cantos e danças, louvando a Senhora do Rosário, e o bispo senhor da cerimônia.

Era tempo do rei negro, rainha negra, sob o comando religioso de um bispo negro, com o povo negro tomando conta da festa. O município com a maior população quilombola de Minas Gerais cantava alegremente: “Essa dança aqui é de preto só, se branco entrar cai no cipó”. Mas, o bispo, democrático, chamava também a minoria branca, para mudar o mundo e o canto: “Essa dança aqui é de preto só, se branco entrar fica mió”.

Via Blog do Banu

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