Alma de criança, cerne da exposição dos “indígenas gigantes” (Exposição/Divulgação)

Por Manoel Freitas – O Norte

O Brasil abriga um grande número de povos indígenas, em festa, mais do que nunca, com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) quinta-feira (21), que considerou inconstitucional a tese do marco temporal das terras indígenas. E é nesse momento importante que a Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), abre em seu Museu Regional, em diferentes espaços, exposição do artista Auiri Tiago, fruto de sua convivência de 42 dias com o Povo Panará, principalmente na Aldeia Nânsepotiti.

Oficialmente contatados em 1973, quando a estrada Cuiabá/Santarém (BR-163) estava em construção e cortava seu território tradicional, são também conhecidos como Krenakore ou Indígenas Gigantes. Há 26 anos concluíram seu retorno a uma parte de suas terras tradicionais na fronteira do Mato Grosso com o Pará, deixando o Parque Indígena do Xingu (MT) após longo exílio forçado.

Exílio necessário na época posto que a violência do contato ocasionou a morte de dois terços de sua população, em razão de doenças e massacres. Ou seja, são protagonistas de uma saga. De modo que Auiri não escolheu a etnia por acaso. “O aprendizado com meus manos da floresta foi imensurável”, resume o artista montes-clarense.

“Foi muito bom estar tão perto dos Panará, que conseguiram retomar várias tradições perdidas, além de um expressivo crescimento demográfico, hoje são mais de 500”.

O REINO-ALDEIA QUE EXISTE EM NÓS
Ativista, aos 35 anos de idade, “bem vividos”, aborda a questão dos direitos dos povos originários e utiliza a arte como ferramenta de existir. “A exposição, por desejo, oferece aos de coração puro, forças para despertar o reino-aldeia que existe em nós. Coragem nunca a de nos faltar!”, diz Auíri Tiago, filho de Dona Maria e Seu José.

A exposição, ressalta, é seu modo de demonstrar respeito à sua história, cultura e ancestralidade dos Panará.

“Caí aqui na Terra, para experimentar ser um humano, latino americano, brasileiro, norte mineiro, catrumano de coração, cosmopolita de alma”. Formado em Letras, especialista em Educação, Pobreza e Desigualdade Social pela UFMG, mestre em Educação Internacional pela Universidade da Flórida, possui oito livros publicados “e outros 88 em sua cabeça”.

Quando completou 33 anos, “decidi morrer pra continuar vivendo, ou seja, largou tudo e começou outros caminhos, agora estudante de Biologia. Percorreu o mundo, “aprendi muitas coisas, menos odiar”. Hoje, mora em uma casinha no meio do mato/cerrado, desfrutando dos seus anos sabáticos e longe da correria da cidade grande. Exercitou em gostar de pintar e fotografar como forma de “descobrir as insignificâncias do mundo”.

Sobre os “Indígenas Gigantes”, explica ser prazeroso saber que sua população é crescente, “tanto é verdade que fundaram mais quatro aldeias, Nânsepotiti-Kresan, Sankuê, Sôkarasã e Kôtikô “para distribuir melhor os recursos naturais, a caça e os peixes, de modo que haja fartura e nada falte a eles”.

Povo Panará, coração de criança
O NORTE foi ao Museu Regional da Unimontes, no centro histórico de Montes Claros, para documentar a exposição “Aldeia do Amanhã: Kokren Priãn (coração de criança), de Auiri Tiago. Percorreu os vários ambientes da mostra fotográfica com Andréia Fonseca Mourão, professora de arte da Escola Estadual Professor Alcides de Carvalho e da Escola Estadual Clóvis Salgado.

“No conjunto da exposição, fica muito claro que há almas de crianças, espírito de crianças em tudo, pela delicadeza, pureza do trabalho”, frisa a professora, explicando que “existe duas vertentes igualmente importantes: as fotografias em preto e branco evidenciam os traços fortes, ao mesmo tempo em que as cores são puro encanto”.

No seu modo de entender, mostras fotográficas, especialmente de etnias, “são de grande importância para manter vivas as culturas de povos originários, porque essa arte, nas mãos de quem tem grande sensibilidade, é na verdade um valioso instrumento para que os estudantes entendam a necessidade de valorizar a diversidade étnico-racial”.

Para a educadora, que acompanha mês a mês a programação do Museu Regional da Unimontes, “a arte de Auiri traz uma reflexão profunda acerca da necessidade de manutenção do mundo e do modo se ser indígena. Salienta que as visitas que faz ao centro histórico “acabam por proporcionar bons debates dentro da sala de aula”.

“Todas são lindas, maravilhosas, mas a que gostei mais foi a dos indígenas correndo em meio às borboletas. Vejo como absolutamente necessária a valorização dos artistas locais, tanto é verdade que acabamos de estudar com os alunos o patrimônio histórico e cultural do Norte de Minas, até porque Montes Claros recebe muitos alunos de todos os municípios da região, do ensino médio à faculdade”, concluiu a professora Andréia Mourão.

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