O presidente é um influenciador poderoso; suas palavras podem levar muitos à morte

Em um ano, a venda de cloroquina e hidroxicloroquina no Brasil aumentou mais de 100%, passando de pouco mais de 800 mil cápsulas, para mais de 2 milhões de unidades.

Ainda mais impressionante é o desempenho das vendas de vermífugos: cerca de 8 milhões de comprimidos comercializados em 2019, contra mais de 50 milhões em 2020.

Não há qualquer razão científica ou mercadológica para tal fenômeno. As drogas não servem para nada além do que já serviam, e não houve nenhum surto de malária, lupus, vermes etc.

Absolutamente todos os países sérios e órgãos sanitários oficiais, além dos mais importantes hospitais do mundo, se pronunciaram sobre a ineficácia destas drogas contra o novo coronavírus.

A própria farmacêutica (Merck), que produz a Ivermectina, anunciou: “Nenhuma evidência significativa para atividade ou eficácia clínicas em pacientes com COVID-19 foi encontrada”.

E até o devoto da cloroquina dá sinais que mudará o discurso genocida: “Pode ser que lá na frente falem: a chance é zero, era um placebo. Tudo bem, paciência. Me desculpa, tchau”.

Infelizmente, sem qualquer amparo em pesquisas ou na ciência, nem sequer empiricamente embasados, vários médicos no Brasil ainda prescrevem tais medicamentos contra o coronavírus.

E não o fazem senão movidos por ideologia política, tal como milhões de brasileiros crédulos em teorias da conspiração, e ávidos por soluções milagrosas saídas da cabeça de um mito.

Mito, aliás, assim definido em nossa língua: “relato fantástico de tradição oral, protagonizado por seres que encarnam forças da natureza e aspectos gerais da condição humana; lenda”.

Aproximadamente 85% das pessoas que contraem o novo coronavírus escapam da morte sem quaisquer sintomas e sem necessidade de internação. Isso é fato, e não teoria.

Cerca de 10% dos contaminados desenvolvem a forma grave da doença, e em algum tempo precisam ser hospitalizados, mas se recuperam após alguns dias. Isso é fato, e não teoria.

Por outro lado, 5% dos doentes acabam necessitando de internação em uma UTI. Destes, mais ou menos 1/3, infelizmente, acabam falecendo. Isso também é fato, e não teoria.

Hoje é sabido que a taxa de mortalidade por COVID-19 é de 0.8% a 1.2%, em média. Idade e condições de saúde aumentam ou diminuem, sobremaneira, tais números. Fato! Não, teoria.

Tudo isso ocorreu – e ocorre – em todos os países. Tudo isso ocorreu – e ocorre – com mais de 105 milhões de contaminados e mais de 2.2 milhões de mortos. Repito: fato! Não teoria.

Ocorreu – e ocorre – senhoras e senhoras, com o uso ou não de cloroquina, hidroxicloroquina, vermífugo, vitamina D, protetor solar, reza brava, garrafada, vodca ou ingestão de desinfetantes.

“Ah, na minha família todos pegaram, se trataram com cloroquina e se recuperaram”. Ótimo! Seja bem-vindo ao clube dos quase nove recuperados, em dez, que não usaram nada.

“Então, por que tantos médicos indicam o tratamento precoce”? Bem, ou por ideologia, como já disse, ou por sincera vontade de salvar vidas, mesmo sabendo que não funciona.

Para se comprovar a eficácia de uma droga é preciso que se compare, de forma randômica e “cega”, grupos controlados. Todas as vezes em que isso foi feito, o resultado foi claro:

Cloroquina, hidroxicloroquina e vermífugos, juntos ou separados, no início da doença ou após seu agravamento, NÃO foram eficazes no combate ao vírus e nem reduziram os óbitos.

Pouco importam as experiências pessoais de cada um. Pouco importam os achismos dos especialistas nisso ou naquilo. Pouco importam as mentiras contadas por Bolsonaro ou Terra.

Pesquisas sérias, testes controlados, resultados checados, laudos assinados por médicos e instituições respeitadas são o que vale. O resto é curandeirismo de terceiro mundo.

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Não seria um ignorante como Bolsonaro, não seriam médicos comuns brasileiros, não seriam bolsonaristas fanáticos que iriam descobrir o que o mundo inteiro procura, e não encontrou.

Você quer tomar cloroquina? Beleza. Mas procure um médico para te acompanhar. Quer tomar vermífugo? Manda ver. Mas cuidado com os rins e o fígado. Quer tomar pinga? Tome.

O importante, caro leitor, cara leitora, é não se esquecer dos cuidados que realmente salvam vidas: lavar as mãos, não se aglomerar, usar álcool em gel, não esquecer da máscara etc.

O importante é não espalhar fake news, não recomendar crendices, ficar em casa o máximo que puder, e jamais, em tempo algum, acreditar em qualquer tipo de tratamento precoce.

O importante é se vacinar, se e quando houver vacinas disponíveis no Brasil, e procurar um médico tão logo desconfie que está doente. Atenção: parente não é médico (se não for um).

Acredite: o presidente da República, ou qualquer outro político, não estarão presentes ao seu enterro ou de quem você ama. Não te ajudarão a segurar o caixão enquanto você chora.

Cuide de si e de sua família. Cuide dos seus amigos queridos e dos queridos de seus amigos queridos. Não espere que político algum faça o que você tem de fazer. Ou te diga o que fazer.

Muitos podem ter morrido por causa do que diz Bolsonaro. Muitos se entupiram de remédios por acreditarem em Bolsonaro. Muitos se contaminaram, e contaminaram outros, por ouvirem Bolsonaro.

Uma propaganda oficial antiga dizia: “não faça do seu carro uma arma; a vítima pode ser você. Trazendo para hoje: não faça da sua ideologia uma arma; a vítima pode ser você.

Via Estado de Minas

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