PEC DA BENGALA
PSL pretende diminuir idade de aposentadoria dos ministros; assim, o novo presidente poderia indicar quase 40% da Corte
Com o objetivo de aposentar compulsoriamente pelo menos quatro ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e facilitar a nomeação de novos magistrados pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL), a deputada Bia Kicis (PSL-DF) está coletando assinaturas na Câmara dos Deputados para propor uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC). A parlamentar tenta atingir a marca de 171 assinaturas. Com isso, o projeto poderia ir ao Plenário da Câmara e do Senado e, caso vencesse, derrubaria a regra atual, em que ministros do Supremo se aposentam aos 75 anos, e a idade cairia para 70 anos.
Os ministros Celso de Mello e Marco Aurélio Mello já se aposentariam entre 2020 e 2021. Mas se a medida for aprovada, Ricardo Lewandowski e Rosa Weber, que já completaram 70 anos, também seriam aposentados. Com isso, Bolsonaro teria nas mãos a indicação de quase 40% da Corte Suprema.
Nas redes sociais, a deputada afirma que quer um STF em harmonia com as demandas da população brasileira que elegeu Bolsonaro presidente. Contrária a tornar crime as agressões e mortes contra homossexuais, pauta que está sendo votada pelo Supremo, Bia Kicis se diz “defensora ferrenha da revogação da PEC da Bengala”.
A proposta coincide com a tentativa de tramitação de outra PEC: a da Previdência. Nesta, os aliados de Bolsonaro pretendem exatamente o contrário: aumentar a idade mínima de aposentadoria dos trabalhadores brasileiros.
PEC da Bengala
A PEC da Bengala, que foi aprovada em 2015 e subiu para 75 anos a idade de aposentadoria dos juízes dos tribunais superiores e do Tribunal de Contas da União (TCU), teve na época o apoio do então deputado federal Jair Bolsonaro. O objetivo dele era evitar que a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) pudesse indicar mais ministros.
Na prática, a PEC da Bengala retirou o poder de Dilma de fazer cinco indicações ao Supremo até o fim de 2018. Além do Supremo, Dilma perdeu a indicação de 13 magistrados em outros tribunais superiores — somando três do Superior Tribunal de Justiça (STJ), três do Tribunal Superior do Trabalho (TST), seis do Superior Tribunal Militar (STM) e um do TCU.
Para o professor de Direito Constitucional da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Daniel Sarmento, a manobra é inconstitucional. Ele acrescenta que medidas como essa, em que o Executivo tenta emparedar o Judiciário, se tornaram comuns em países que não respeitam regras básicas da democracia, como a independência dos poderes.
“As emendas constitucionais não podem ofender cláusulas pétreas. Há uma proposta que ofende cláusula pétrea, ofende a separação de poderes. Não é discutir se em tese é possível mudar a idade de aposentadoria de juízes, isso tem que ser analisado contextualmente. Se há uma tentativa de fragilizar o Judiciário e dificultar o exercício de uma das funções dele, que é controlar o poder, uma das maneiras de se fazer isso é enchendo o poder judiciário de pessoas que são alinhadas ao poder”, explica.
Inconstitucional
Além de inconstitucional, a proposta é uma resposta às pautas que o Congresso engaveta – como a de criminalizar a homofobia – e que o Supremo é provocado a votar por ações externas. Sarmento cita o recente pedido de impeachment do ministro Ricardo Lewandowski, de autoria de grupos conservadores e ligados a Bolsonaro.
“Mudar de novo e com propósito específico, tirar do STF determinados ministros com uma visão mais favorável aos direitos humanos e que podem ser limites para o governo e para as maiorias legislativas, é claramente inconstitucional”, afirma o professor, lembrando de outros tempos do país. “Na ditadura, três ministros foram aposentados e outros três foram colocados lá”.