Procuradoria acusa ex-presidente de liderar organização criminosa para impedir posse de Lula e romper a ordem democrática. Somadas, as penas máximas chegam a 43 anos de prisão
A Procuradoria-Geral da República (PGR) denunciou nesta terça-feira (18) o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outras 33 pessoas por crimes contra a democracia. A acusação, formalizada ao Supremo Tribunal Federal (STF), inclui tentativa de golpe de Estado, abolição violenta do Estado democrático de Direito, organização criminosa e dano qualificado ao patrimônio da União.

“Aqui se relatam fatos protagonizados por um presidente da República que forma com outros personagens civis e militares organização criminosa estruturada para impedir que o resultado da vontade popular expressa nas eleições presidenciais de 2022 fosse cumprido, implicando a continuidade no poder sem o assentimento regular do sufrágio universal”, afirma a peça acusatória assinada pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet.

A PGR sustenta que Bolsonaro e seus aliados atuaram para anular o resultado das eleições de 2022 e manter o então presidente no poder por meios ilegais. A denúncia formaliza as seguintes acusações:

Abolição violenta do Estado democrático de Direito (art. 359-L do Código Penal) – pena de 4 a 8 anos de prisão.
Golpe de Estado (art. 359-M do Código Penal) – pena de 4 a 12 anos de prisão.
Organização criminosa (art. 2º da Lei 12.850/2013) – pena de 3 a 8 anos de prisão.
Dano qualificado contra patrimônio da União (art. 163 do Código Penal) – pena agravada pelo uso de violência e grave ameaça.
Deterioração de patrimônio tombado (art. 62, I, da Lei 9.605/1998) – pena de 1 a 3 anos de reclusão.
A soma das penas máximas pode alcançar 43 anos de reclusão. Além disso, Bolsonaro, já condenado à inelegibilidade pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) até 2030, pode ter essa restrição ampliada.

A denúncia da PGR é dividida em cinco peças, relacionadas às suspeitas sobre a trama golpista depois da derrota de Bolsonaro. Isso deve facilitar o julgamento dos envolvidos, de acordo com os diferentes núcleos investigados pela Polícia Federal. São elas:

Liderança e articulação política da trama golpista – Envolve Bolsonaro, Braga Netto e ministros que atuaram na tentativa de ruptura institucional.
A participação de militares no planejamento do golpe – Investigação detalhada sobre o envolvimento de generais e oficiais das Forças Armadas.
Uso da Polícia Rodoviária Federal para interferir no processo eleitoral – Aponta o papel de Silvinei Vasques e outros agentes da PRF na tentativa de dificultar o voto em regiões de maioria lulista.
A estruturação de um sistema paralelo de inteligência – Foca no esquema montado dentro da Abin e na atuação de Alexandre Ramagem e subordinados.
A facilitação e omissão no 8 de janeiro – Investiga a colaboração e conivência de agentes públicos com os atos golpistas que resultaram na invasão das sedes dos Três Poderes.
Além de Bolsonaro, outras 33 pessoas foram denunciadas, entre eles o ex-ministro Walter Braga Netto, que foi candidato a vice-presidente na chapa de 2022 e, atualmente, está preso preventivamente. Fora o general, outros cinco estão detidos.

Também foram denunciados os ex-ministros Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), Anderson Torres (Justiça), o ex-comandante da Marinha Almir Garnier Santos e o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro Mauro Cid, que firmou acordo de delação premiada e deve obter benefícios.

A lista dos denunciados inclui 23 militares das Forças Armadas —7 deles são oficiais-generais. Somente a Aeronáutica não teve acusados. A denúncia estrutura os acusados em diferentes núcleos:

Liderança política:
Jair Bolsonaro (ex-presidente da República)
Walter Braga Netto (ex-ministro da Defesa e candidato a vice-presidente em 2022)
Militares de alta patente:
Augusto Heleno (ex-ministro do GSI e general da reserva do Exército)
Paulo Sérgio Nogueira (ex-ministro da Defesa e general do Exército)
Almir Garnier (ex-comandante da Marinha e almirante de esquadra)
Estevam Cals Theophilo Gaspar de Oliveira (ex-chefe do Comando de Operações Terrestres, general do Exército)
Mário Fernandes (ex-secretário-executivo da Secretaria-Geral da Presidência, general do Exército)
Hélio Ferreira Lima (tenente-coronel do Exército, atualmente preso)
Rafael Martins de Oliveira (tenente-coronel do Exército, atualmente preso)
Guilherme Marques de Almeida (tenente-coronel do Exército e ex-comandante do 1º Batalhão de Operações Psicológicas)
Sérgio Ricardo Cavaliere de Medeiros (tenente-coronel do Exército e ex-ajudante de ordens de Bolsonaro)
Ronald Ferreira de Araújo Júnior (tenente-coronel do Exército)
Nilton Diniz Rodrigues (general do Exército)
Civis e ex-integrantes do governo:
Anderson Torres (ex-ministro da Justiça)
Alexandre Ramagem (ex-diretor da Abin e atual deputado federal pelo PL)
Filipe Martins (ex-assessor especial da Presidência)
Paulo Renato de Oliveira Figueiredo Filho (empresário e ex-apresentador da Jovem Pan)
Forças de segurança e aliados:
Silvinei Vasques (ex-diretor da PRF, acusado de obstruir o voto de eleitores lulistas)
Marília Ferreira de Alencar (ex-subsecretária de inteligência da Secretaria de Segurança Pública do DF)
Fernando de Sousa Oliveira (ex-número 2 da Secretaria de Segurança Pública do DF)
Marcelo Araújo Bormevet (policial federal, ex-segurança de Bolsonaro)
Rodrigo Bezerra de Azevedo (tenente-coronel do Exército, conhecido como “kid preto”)
Reginaldo Vieira de Abreu (coronel do Exército, chefe de gabinete de Mário Fernandes)
Márcio Nunes de Resende Júnior (coronel do Exército)
Carlos Cezar Moretzsohn Rocha (engenheiro e presidente do Instituto Voto Legal)
Ailton Gonçalves Moraes Barros (capitão reformado do Exército)
Wladimir Matos Soares (policial federal, atualmente preso)
Giancarlo Gomes Rodrigues (subtenente do Exército)
Linha do tempo da trama golpista

A denúncia detalha a escalada de ataques ao sistema eleitoral e à democracia brasileira:

2021 – Bolsonaro intensifica ataques às urnas eletrônicas e ao STF.
Julho de 2022 – Em reunião ministerial, governo discute possibilidade de golpe e uso das Forças Armadas.
Outubro de 2022 – Bolsonaro perde as eleições, e aliados iniciam operações para questionar o resultado.
Novembro de 2022 – Polícia Rodoviária Federal realiza bloqueios em regiões de maioria lulista.
Dezembro de 2022 – Minutas golpistas são elaboradas; Braga Netto recebe generais para debater intervenção militar.
8 de janeiro de 2023 – Invasão das sedes dos Três Poderes por bolsonaristas radicais.
Fevereiro de 2025 – PGR formaliza denúncia contra Bolsonaro e aliados.
De acordo com a acusação, “a organização também concorreu, em 8.1.2023, na Praça dos Três Poderes, para a destruição, inutilização e deterioração de patrimônio da União, em investida ocorrida contra as sedes do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal”.

Próximos passos no STF

A denúncia será analisada pela Primeira Turma do STF, composta por Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Cristiano Zanin e Flávio Dino. Caso seja aceita, Bolsonaro e os demais denunciados se tornarão réus e poderão ser julgados ainda em 2025.

Ministros do Supremo desejam concluir o julgamento antes das eleições de 2026 para evitar interferências políticas. No entanto, advogados dos denunciados devem recorrer para tentar atrasar o andamento do processo.

A PGR considera que a responsabilização dos envolvidos é essencial para proteger a democracia. “A defesa da democracia se realiza em vários níveis de intensidade institucional. Ao Ministério Público essa responsabilidade sobe de ponto”, afirma a denúncia.

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