Em entrevista ao EM, Shirley Manacês, de 33 anos, relatou alguns dos episódios em que foi assediada sexualmente

Shirley Manacês integrava o quadro de militares da PMMG desde 6 de janeiro de 2014 – (foto: Arquivo pessoal)

A ex-policial Shirley Manacês, de 33 anos, e o advogado dela, Berlinque Cantelmo, denunciaram ao Estado de Minas episódios recorrentes de assédio sexual na corporação e um processo administrativo — segundo eles, “irregular” —, que resultou na demissão da agente. Lotada no 36º batalhão em Vespasiano, na Grande BH, a então sargento foi desligada da corporação na quinta-feira passada (24/8) depois de publicar vídeos dançando na plataforma Bigo Live em 2019. Ela integrava o quadro de militares da PMMG desde 6 de janeiro de 2014.

“Trata-se de uma plataforma pública, gratuita e com diretrizes para os usuários similares a outras redes, como Facebook e Instagram”, pontua o advogado, acrescentando que sua cliente foi demitida — depois de três anos de processo — por ter “adotado conduta ofensiva à honra pessoal e ao decoro da classe”, conforme, segundo ele, justifica a PM ao recorrer ao código de ética da lei estadual 14.310/2002 nos autos do processo.
No entanto, os vídeos que ela gravou não têm conotação sexual, diz Cantelmo. “Ela nunca dançou de roupa íntima, por exemplo, ou fez menção à PM. Acontece que, ao longo de quase 10 anos, ela sofreu diversos tipos de assédio, como sexual, moral e psicológico. Policiais tentaram sair com ela, forçando um relacionamento, até que os vídeos foram descobertos pouco depois dela iniciar as publicações. Alguém entrou nessa plataforma e a reconheceu como policial militar. Desconfiamos que seja algum agente infiltrado da corregedoria da PM”, afirma Cantelmo, que é especialista em direito militar.

Demissão na frente de militares e perda do bebê

Cantelmo diz ainda que o desligamento de Shirley aconteceu na frente de outros militares abaixo dela na hierarquia da polícia, como cabo e soldado. “Na ocasião, ela estava grávida de oito semanas e foi chamada na frente deles, sendo escoltada até em casa para pegar a farda”, declara.
hirley diz que imediatamente chamou o sargento responsável pelo destacamento do pelotão. “Ele pediu para eu não tomar providências, pois iria conversar com ele e que isso não iria mais se repetir. Fiquei constrangida e sem lugar. Antes disso, eu já tinha tomado conhecimento que esse mesmo sargento já tinha tirado foto minha de costas”, alega.
Em 2018, em BH, Shirley conta que estava encarregada de um processo envolvendo um cabo, quando um oficial da corporação, que ela precisava ouvir, a fez ficar “o dia todo” no batalhão aguardando-o. “Após isso, ele fez contato via WhatsApp comigo e, por pelo menos uns três dias, sob alegação de que estava para ir embora para outra cidade, insistiu muito para sair comigo. Durante todo esse tempo na polícia, sempre conseguiam o meu telefone por meios que desconheço”, finaliza.

Irregularidades no Processo Administrativo Disciplinar (PAD)

Antes da demissão, em 20 de julho, um médico da Polícia Militar emitiu um relatório no qual Shirley é diagnosticada com depressão. No documento, que a reportagem teve acesso, o profissional recomenda o afastamento da policial por um período mínimo de 60 dias e seu acompanhamento psicológico. “A continuação da tramitação do PAD desrespeitou ordens médicas. O processo deveria ter sido suspenso até que ela estivesse em plenas condições de respondê-lo”, avalia o advogado.
“A segunda irregularidade é a ausência de critério na tomada de decisão por parte do conselho de ética, da comissão processante e da própria coronel corregedora. Outros militares submetidos a processos [semelhantes] não foram tratados da mesma forma e sequer foram demitidos da corporação”, pontua Cantelmo.
Por fim, o advogado de Shirley diz que “determinados requerimentos da defesa” não foram colocados nos autos do processo. “Não trouxeram a cadeia de custódia das provas digitais e as origens efetivas dos vídeos, além de não demonstrarem se ela ganhou ou não dinheiro com qualquer tipo de exposição em rede social. Não fizeram porque isso não existiu. Foi uma falácia processual para persegui-la e demiti-la”, diz ele.

O que diz a Polícia Militar

Procurada pela reportagem para comentar a demissão da profissional, a Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG) esclarece, por meio de nota, que Shirley Manacês foi “submetida a Procedimento Administrativo Demissionário (PAD), tendo sido garantido o direito ao contraditório e ampla defesa, com integral acompanhamento do seu defensor”.
“Após o trâmite do devido processo legal foi decidido por sua demissão da Polícia Militar”, finaliza a instituição, que manteve a mesma nota ao ser questionada em um segundo contato da reportagem sobre as denúncias de assédio sexual.
Fonte: EM

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

quatro × 5 =