A activista indígena Walelasoetxeige Paiter Bandeira Suruí, conhecida como Txai Suruí, da etnia paiter-suruí, na COP26 de Glasgow, em 1º de novembre de 2021 (Oli SCARFF/AFP)
Ministros de países desenvolvidos pedem reuniões com a jovem, que recebe ligações do Vaticano, mas é ameaçada por bolsonaristas
Txai Suruí tem 24 anos, está perto de se formar em Direito e pertence à tribo brasileira paiter-suruí. Na COP26 de Glasgow os indígenas não estão entre os negociadores, mas graças a seu discurso na abertura do evento, Txai virou uma das estrelas da reunião.
Há 10 dias, Txai concede entrevistas, os ministros de países desenvolvidos pedem reuniões com a jovem e ela recebe ligações do Vaticano.
Também recebe ameaças de morte e mensagens “racistas”, afirmou em entrevista.
Mas ela confessa que no fundo gostaria de não estar em Glasgow. “Espero não ter que vir mais aqui. Espero que as pessoas se reúnam aqui (na COP) para falar sobre as coisas bonitas que conseguiram, sobre a justiça climática”, declarou.
Txai procede de uma família muito ativa na luta pelos direitos do povo suruí no estado de Rondônia.
Seu pai, Almir Narayamoga, se tornou cacique da tribo com apenas 17 anos, lutou contra os madeireiros ilegais, foi ameaçado de morte e teve que sari de seu estado por vários meses, assim como sua mãe.
Txai segue agora os mesmos passos. Este ano ela apresentou, ao lado de outros jovens, uma ação contra o Estado brasileiro por não cumprir suas metas climáticas. E por isto também foi ameaçada.
Mensagens racistas, de ódio
“Temos ideias para adiar o fim do mundo. Acabemos com as mentiras”, pediu em inglês diante dos líderes mundiais na COP26.
Txai denuncia que o presidente Jair Bolsonaro a criticou depois do discurso.
“Estou recebendo várias mensagens racistas e mensagens de ódio porque eles não gostam que a gente venha aqui e fale a realidade do Brasil”, disse.
“Eu não tenho medo porque, na verdade, a nossa realidade e a realidade dos povos indígenas no Brasil é muito mais perigosa do que as mensagens na internet”, completa.
Mas em seu retorno ao Brasil, ela deve receber proteção, afirma, sem entrar em detalhes. “O meu estado é um dos mais bolsonaristas e um dos mais perigosos para ativistas de direitos humanos e do meio ambiente”, explica.
Txai exibe um sorriso tranquilo nos corredores da sede da COP26. Ela usa um traje típico de seu povo e fala com serenidade sobre sua luta.
“Eu perdi um amigo por causa dessa luta, a gente já perdeu muitos líderes indígenas do Brasil por causa dessa luta”, afirma.
“O governo brasileiro pratica uma política assassina”, declara. Txai afirma que na reserva dos suruí, em Sete de Setembro, mais de 6 mil cabeças de gado pastam sem permissão. O território precisa ser vigiado constantemente, pois as invasões são incessantes.
“Mas falar da Amazônia também é falar de uma situação mundial”, explica. “Os povos indígenas estão abertos a receber ajuda”, completa.
A COP26 reúne apenas os Estados parte. Os indígenas mal conseguiram em outro fórum recente, o Congresso Mundial da Natureza, organizado em Marselha, ter sua própria categoria de membros.
Txai disse que não espera retornar a outra COP, mas que gostaria de ver os indígenas como parte integrante das negociações.
“Os outros países têm que entender que podem ajudar os povos indígenas do Brasil sem ofender nossa soberania”, disse.
Txai se considera tão indígena como brasileira. Ao ser questionada o que a levou a estudar Direito, responde sem hesitar. “O Direito me escolheu”. Seus pais a estimularam a fazer a matrícula na faculdade em Porto Velho, capital de Rondônia.
Ela afirma, com orgulho, que foi autorizada a fazer a matrícula quando ainda não havia concluído o Ensino Médio.
Txai está a apenas um semestre do fim do curso. A ação judicial contra o Estado está apenas começando, em seu retorno ao Brasil ela terá muito trabalho pela frente. Também planeja se casar e gostaria de voltar a morar em sua aldeia de Lapetanha.
Ela afirma que gostou de Glasgow, “mas faz muito frio”, admite, com seu sorriso.
AFP