O Senado aprovou nesta quarta-feira (8) a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da reforma tributária em dois turnos, marcando um avanço significativo no processo de reforma fiscal do país. No entanto, a PEC agora retorna à Câmara dos Deputados, uma vez que os senadores fizeram alterações em relação às decisões anteriores da Câmara.
Para que a reforma tributária se torne lei, é necessário que ela seja aprovada novamente na Câmara. A reforma visa simplificar os impostos federais, estaduais e municipais e introduzir tratamentos diferenciados para setores específicos, com alíquotas reduzidas, como serviços de educação, medicamentos, transporte coletivo de passageiros e produtos agropecuários.
Confira os principais pontos da PEC:
Criação do IVA (Imposto sobre o Valor Agregado)
A proposta introduz o Imposto sobre o Valor Agregado (IVA) no sistema tributário nacional. De acordo com o texto, cinco impostos existentes hoje serão substituídos por dois IVAs:
- Três tributos federais (PIS, Cofins e IPI) se unirão para formar a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de competência federal.
- O ICMS (estadual) e o ISS (municipal) serão unificados no formato do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), com gestão compartilhada entre estados e municípios.
No modelo do IVA, os impostos não se acumulam ao longo da cadeia de produção de um item, evitando, por exemplo, a tributação da matéria-prima que deu origem ao produto.
As alíquotas do IVA ainda serão determinadas em regulamentação da PEC, com a estimativa de cerca de 27,5% sobre o valor do produto para manter a carga tributária atual do país.
Além disso, os impostos serão cobrados no destino final, onde o bem ou serviço será consumido, em vez de na origem, o que combaterá a “guerra fiscal” entre os estados.
Fase de Transição
A proposta estabelece um período de transição para a unificação dos tributos, que durará até sete anos, entre 2026 e 2032. A partir de 2033, os impostos atuais serão extintos.
A fase de transição seguirá o seguinte cronograma:
- Em 2026: Alíquota de teste de 0,9% para a CBS (IVA federal) e de 0,1% para o IBS (IVA compartilhado entre estados e municípios).
Em 2027: PIS e Cofins serão extintos. A CBS será totalmente implementada, e a alíquota do IBS permanecerá em 0,1%. - Entre 2029 e 2032: Redução gradual das alíquotas do ICMS e do ISS e aumento progressivo do IBS.
- Em 2033: Vigência integral do novo modelo e extinção do ICMS e do ISS.
Além disso, o texto prevê a extinção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) em 2027, dando lugar à Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) para manter a competitividade da Zona Franca de Manaus. Neste ano, também está prevista a entrada em vigor do Imposto Seletivo, apelidado de “imposto do pecado”.
Alíquotas dos Impostos e ‘Trava’
As alíquotas dos impostos serão definidas por lei. Uma resolução do Senado estabelecerá os valores de referência quando não houver legislação específica.
O texto contém um mecanismo que impede a perda de arrecadação nos primeiros anos da reforma, funcionando como uma “trava” para o aumento das cobranças. A regra levará em consideração a média de arrecadação dos impostos extintos e o Produto Interno Bruto (PIB), podendo acionar uma redução das cobranças.
O Tribunal de Contas da União (TCU) será responsável por fiscalizar e calcular as alíquotas de referência.
Cesta Básica e ‘Cashback’
O texto mantém a criação de uma cesta básica nacional de alimentos isenta de tributos, com alíquotas reduzidas a zero para produtos de higiene pessoal e limpeza predominantemente consumidos por famílias de baixa renda.
Além disso, a PEC prevê a possibilidade de criação futura do chamado “cashback” por meio de lei complementar, permitindo a devolução de impostos para grupos específicos para reduzir desigualdades de renda.
O “cashback” será obrigatório para o fornecimento de energia elétrica a uma parte da população e para a compra de gás de cozinha.
Alíquotas Reduzidas
A PEC prevê um corte de 60% nas alíquotas de impostos para 13 setores, estabelecendo alíquotas equivalentes a 40% do IBS (IVA estadual e municipal) e do CBS (IVA federal). Os setores beneficiados incluem serviços de educação, saúde, dispositivos médicos, medicamentos, entre outros.
Uma nova alteração inclui a possibilidade de reduzir em 30% as alíquotas sobre a prestação de serviços de profissionais liberais, como advogados e contadores. A manutenção desses benefícios será reavaliada a cada 5 anos.
Isenções
A PEC estabelece a possibilidade de isentar a cobrança dos IVAs sobre uma série de bens e tributos, com as decisões tomadas por lei complementar. Itens passíveis de isenção incluem serviços de transporte coletivo, dispositivos médicos, produtos de cuidados à saúde menstrual, entre outros.
Tratamentos Diferenciados
A proposta permite que alguns produtos e serviços recebam tratamento específico na cobrança de IVAs, incluindo combustíveis, serviços financeiros, hotéis, parques de diversão, entre outros. A definição desses benefícios ocorrerá por lei complementar.
‘Imposto do Pecado’
A reforma prevê a criação de um Imposto Seletivo sobre bens e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, conhecido como “imposto do pecado.” O tributo tem o objetivo de desencorajar o consumo desses produtos por meio de uma cobrança adicional.
O Imposto Seletivo será cobrado em uma única fase da cadeia e não incidirá sobre exportações, operações com energia elétrica e telecomunicações.
O texto inclui armas e munições na lista de produtos sujeitos ao “imposto do pecado,” com exceção quando o armamento for destinado à administração pública.
Tributação da Renda e do Patrimônio
O texto mantém as alterações propostas na Câmara em relação à cobrança de impostos sobre renda e patrimônio.
IPVA para Jatinhos, Iates e Lanchas
A proposta permite a cobrança de IPVA para jatinhos, iates e lanchas, com a possibilidade de uma tributação progressiva em razão do impacto ambiental dessas embarcações. A exceção se aplica a aeronaves usadas em serviços agrícolas.
Tributação Progressiva sobre Heranças
O texto estabelece uma cobrança progressiva do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), considerando o valor da herança ou da doação. A cobrança será feita no domicílio da pessoa falecida para evitar que os herdeiros busquem locais com tributação menor para processar o inventário.
A proposta também cria uma regra para cobrança de heranças no exterior.
Fundo de Desenvolvimento Regional e Fundo de Compensação
A PEC propõe a criação do Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR) para reduzir as desigualdades regionais e sociais, com repasses da União a estados e ao Distrito Federal. Os recursos devem ser prioritariamente destinados a projetos de sustentabilidade ambiental e redução das emissões de carbono.
O Fundo receberá repasses anuais com correção inflacionária, começando em 2029 com R$ 8 bilhões e chegando a R$ 60 bilhões a partir de 2043. A distribuição dos recursos seguirá critérios de FPE e população do estado.
O projeto também cria um Fundo de Compensação para pessoas físicas ou jurídicas que perderam benefícios fiscais já concedidos até 2032, com um valor total de R$ 160 bilhões.
Gestão do IBS
A gestão do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) é um dos pontos-chave na proposta de Reforma Tributária em discussão. O Comitê Gestor do IBS, que irá substituir o ICMS e o ISS, recebeu atualizações no parecer de Braga, relator da matéria.
Essa estrutura, anteriormente chamada de Conselho Federativo, terá a responsabilidade de centralizar a arrecadação do futuro IVA compartilhado. Além disso, o comitê também será encarregado de distribuir os montantes arrecadados com o IBS e efetuar as devidas compensações.
Em relação à composição do comitê, a proposta permanece a mesma: 27 conselheiros representando os estados e o Distrito Federal, um para cada Unidade da Federação; 14 representantes eleitos pelos municípios, com voto em peso igual; e 13 representantes eleitos pelos municípios, com voto ponderado pelo número de habitantes.
Para as decisões do comitê, será necessário alcançar a maioria absoluta de representantes nos estados, juntamente com representantes que correspondam a mais de 50% da população do país. Nos municípios, será exigida a maioria absoluta de representantes.
Outra mudança introduzida por Braga diz respeito à presidência do comitê. O escolhido para o cargo deverá apresentar notório conhecimento em administração tributária e ser aprovado por pelo menos 41 senadores. Além disso, o presidente do comitê poderá ser convocado para prestar esclarecimentos tanto pela Câmara quanto pelo Senado, seguindo o modelo aplicado a ministros.
Entidades religiosas e financiamento de passagens
A Reforma Tributária também mantém a ampliação do dispositivo constitucional que proíbe a criação de impostos sobre atividades de templos religiosos, entidades religiosas, e organizações assistenciais e beneficentes ligadas a entidades e templos. Os serviços postais dos Correios também foram incluídos nessa lista de setores isentos de tributação.
Zona Franca de Manaus
Além disso, a proposta traz avanços nos mecanismos para a manutenção da Zona Franca de Manaus, estabelecendo que o incentivo fiscal poderá ser realizado através da criação de uma Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) sobre a importação, produção ou comercialização de bens beneficiados na ZFM.
Incentivo para veículos
Para incentivar a produção de veículos elétricos e flex, o relator Braga incluiu a possibilidade de adoção de crédito presumido, um benefício fiscal que se estenderá até 2032 e será aplicável a montadoras das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste que iniciarem a produção desses veículos até 1º de janeiro de 2028, bem como fabricantes de peças.