Bolsonaro teria prevaricado ao não fazer nada quando ficou sabendo das denúncias de corrupção na compra da Covaxin; PF poderá coletar depoimento do presidente

A ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou na noite desta sexta-feira (2) abertura de inquérito, por parte da Procuradoria-Geral da República (PGR), contra Jair Bolsonaro pelo suposto crime de prevaricação no caso da compra da vacina indiana Covaxin.

A PGR apresentou mais cedo pedido ao STF para abrir a investigação após ser pressionada pela própria Rosa Weber, que havia rejeitado o pedido inicial da procuradoria para aguardar as conclusões da investigação da CPI da Covid. Agora, Bolsonaro será oficialmente investigado e poderá ter depoimento coletado pela Polícia Federal.

“Não há no texto constitucional ou na legislação de regência qualquer disposição prevendo a suspensão temporária de procedimentos investigatórios correlatos ao objeto da CPI”, disse a ministra ao autorizar a abertura do inquérito.

Indícios de corrupção e prevaricação

O inquérito se dará no âmbito do contrato para a compra da vacina indiana, com aval de Jair Bolsonaro que, no início do ano, aprovou a aquisição do imunizante a um valor 1.000% maior que preço inicialmenteanunciado pelo fabricante. A Covaxin foi a única vacina que teve um intermediário – a Precisa Medicamentos – na negociação, e o agente governista envolvido no esquema, segundo depoimento dos irmãos Miranda, seria Ricardo Barros.

Um telegrama da embaixada brasileira em Nova Délhi mostra que, quando lançada, a vacina produzida pelo laboratório indiano Bharat Biotech custava 100 rúpias ou cerca de 1,34 dólares a dose. Em fevereiro desse ano, sob pressão de Bolsonaro, a Precisa Medicamentos fechou a compra para o Ministério da Saúde pelo valor de 15 dólares a unidade. Ao mesmo tempo, o governo federal rejeitou a compra da vacina da Pfizer a 10 dólares alegando preço muito alto.

A denúncia sobre as irregularidades na compra do imunizante foi feita na última semana pelo deputado Luís Miranda (DEM-DF) em depoimento à CPI do Genocídio. Segundo ele, quando levou a Jair Bolsonaro, em março, os indícios de corrupção da compra da Covaxin, o presidente afirmou que seria “coisa” do líder do governo na Câmara: Ricardo Barros. Bolsonaro, no entanto, nada fez com relação às denúncias de irregularidades.

O que é prevaricação?

À Fórum, o advogado criminalista Rodrigo Corbelari explicou qual o conceito de prevaricação, crime que é previsto no artigo 319 do Código Penal.

“Para a incidência do referido tipo penal é necessário que o funcionário público tenha, com vontade livre e consciente, retardado ou deixado de praticar, indevidamente, ato de ofício; ou praticá-lo contra disposição expressa de Lei, satisfazendo, assim, seu interesse ou sentimento pessoal”, diz Corbelari.

Neste sentido, as denúncias feitas pelos irmãos Miranda na CPI apontam que Bolsonaro teria optado por não investigar o suposto esquema de corrupção no contrato para aquisição de vacinas.

“Diante disso, é possível que uma responsabilização por crime de prevaricação dê ensejo ao impeachment do presidente por enquadramento em crime de responsabilidade por improbidade administrativa”, completa o advogado.

Impeachment

Na última quarta-feira (30), parlamentares protocolaram na Câmara dos Deputados o “superpedido” de impeachment contra o presidente Jair Bolsonaro. Trata-se de uma iniciativa histórica pois a peça que pede a retirada de Bolsonaro do poder é pluripartidária, reunindo deputados que vão de legendas da esquerda à direita.

O pedido, que contém 271 páginas, vem sendo construído desde abril e o texto foi elaborado pela Associação Brasileira de Juristas Pela Democracia (ABJD). Além de parlamentares, assinam o documento movimentos sociais, associações religiosas entre outras entidades da sociedade civil.

“Esse pedido é resultado de um esforço plural, de sistematização e aglutinação de forças políticas e sociais de diversas matizes (…) A Constituição deixa claro que aquele que atenta contra a a própria Constituição comete crime de responsabilidade. O atual presidente está em curso de 23 hipóteses de crime de responsabilidades previstas em lei. Por essas razões, forças de diferentes campos políticos estão conjugadas para que esse pedido seja admitido e se instaure o processo com as cobranças das responsabilidades devidas de um governo que destrói instituições”, disse, em coletiva de imprensa na Câmara logo após o protocolo do documento, o advogado Mauro de Azevedo Menezes, da ABJD.

O “superpedido” protocolado na Câmara unifica os 124 pedidos de impeachment que já tinham sido apresentados e inclui inúmeros supostos crimes cometidos por Bolsonaro, que vão desde a compra e incentivo ao uso de medicamentos sem eficácia comprovada contra a Covid-19, como a cloroquina, passando pelo desrespeito às instituições e chegando até a fatos descobertos mais recentemente, como as denúncias de corrupção no contrato para a compra da vacina Covaxin e o suposto pedido de propina feito por integrante do Ministério da Saúde a uma empresa interessada em vender o imunizante Oxford/Astrazeneca.

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