O Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu, nesta sexta-feira (24), o decreto 48.893/2024 do governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), que estabelecia regras específicas para a consulta prévia a povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais em áreas impactadas por licenciamentos ambientais.
A medida foi anulada por decisão cautelar do ministro Flávio Dino, que destacou que a competência para tratar de assuntos indígenas é da União, tornando o decreto estadual inconstitucional.
A Consulta Livre, Prévia e Informada (CLPI) é um direito garantido a povos originários para que sejam consultados sobre projetos que possam impactar suas terras e modos de vida. A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) entrou com a ação contra o decreto cerca de dois meses após sua publicação, argumentando que o texto restringia direitos fundamentais dessas comunidades.
O decreto de Zema estabelecia critérios que, na prática, limitavam a abrangência da CLPI. Apenas povos indígenas reconhecidos pela Funai, comunidades quilombolas certificadas pela Fundação Cultural Palmares e povos tradicionais registrados pela Comissão Estadual de Desenvolvimento Sustentável poderiam ser consultados. Além disso, terras indígenas seriam consideradas apenas aquelas demarcadas e homologadas pela União, excluindo áreas ainda em processo de regularização. O decreto também dispensava a consulta para comunidades situadas em áreas urbanas.
Essas medidas foram duramente criticadas por lideranças indígenas e quilombolas, que alegaram que o decreto ameaçava sua autonomia e facilitava o avanço de empreendimentos em territórios tradicionais. A Apib classificou o decreto como um retrocesso e afirmou que ele era incompatível com os princípios constitucionais que protegem os direitos dessas populações.
Maurício Terena, advogado indígena e coordenador jurídico da Apib, criticou o decreto como “colonial” e uma tentativa de retirada de direitos. “O governo de Minas Gerais apresenta um histórico de violação de direitos de povos indígenas. O texto do decreto é um reflexo de uma visão ultrapassada e excludente, ignorando a jurisprudência brasileira”, afirmou.
A decisão do STF ocorre em um contexto de intenso debate nacional sobre demarcação de terras. O Marco Temporal, previsto na Lei 14.701, condiciona o direito à demarcação à comprovação de ocupação indígena em 5 de outubro de 1988, o que gera controvérsias e disputas judiciais.
O governador Romeu Zema, por meio de nota oficial, informou que não comenta ações judiciais em andamento, afirmando que se manifestará no processo quando for intimado. Enquanto isso, a suspensão do decreto reforça a importância da consulta prévia como instrumento de proteção dos direitos dos povos originários e tradicionais.